Com vacina em falta, possibilidade de responsabilização de gestores ganha força

Ato de improbidade administrativa depende da verificação do prejuízo e das consequências de eventual violação dos princípios da administração pública/Pixabay
Ato de improbidade administrativa depende da verificação do prejuízo e das consequências de eventual violação dos princípios da administração pública/Pixabay
Prefeitos, governadores, ministro da Saúde e presidente podem ser enquadrados pelo STF por improbidade administrativa por não aplicarem 2ª dose.
Fecha de publicación: 25/05/2021

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Ricardo Lewandowski indicou, no início do mês, que autoridades públicas que deixassem faltar a segunda dose da vacina de Covid-19 para quem já se vacinou com a primeira poderiam, sim, ser enquadradas em ato de improbidade administrativa. A indicação, quase como uma informação alheia ao acórdão que integrava, veio em um processo onde o ministro retirou policiais e professores da lista prioritária de vacinação no Rio de Janeiro. 


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A possibilidade de responsabilização penal de prefeitos, governadores, ministro da Saúde e presidente é possível e pode não ser apenas uma ameaça, avaliam advogados ouvidos por LexLatin. Assim como em outras ações sobre improbidade administrativa, o crime dependerá de uma série de questões ligadas à ação do gestor público – e também sobre o resultado de suas escolhas.

O aviso do Supremo, que ganhou as manchetes naqueles dias, começa tomar tons de ameaça séria à medida em que a campanha de vacinação no país não decola. Segundo dados do Vacinômetro, desenvolvido pela USP (Universidade de São Paulo) com dados do DataSUS, a demanda acumulada de vacinas necessárias apenas para garantir a segunda dose deve aumentar diariamente. 

Hoje, o país precisaria de 6,1 milhões de doses apenas para vacinar os que aguardam a segunda imunização – e o valor deve se elevar a até 21,5 milhões de doses em agosto. A maior demanda ocorreria por vacinas da AstraZeneca, que responde por apenas ⅙ (16,66%) das doses aplicadas no país. 

Lewandowski, ao dar a decisão em uma reclamação feita pela Defensoria Pública do Rio, indicou que qualquer mudança nos planos de vacinação apresentados pelos entes federativos precisam indicar não apenas quem, mas quando tais pessoas terão concluído seus ciclos vacinais. Caso isso não ocorra, escreveu Lewandowski, as consequências irão para a área penal.

Deixar um vacinado com a primeira dose sem a segunda, para o ministro, estaria "sob pena de frustrar-se à legítima confiança daqueles que aguardam a complementação da imunização, em sua maioria idosos e portadores de comorbidades, como também de ficar caracterizada, em tese, a improbidade administrativa dos gestores da saúde pública local", em caso de "desperdiçados os recursos materiais e humanos já investidos na campanha de vacinação inicial."

O sócio da Bento Muniz Advocacia, Wesley Bento, considera que a fala de Lewandowski tende mais a uma visão particular do ministro sobre a gravidade dos fatos." É importante pontuar que a discussão sobre se determinado ato é ou não ato de improbidade depende de análise do caso concreto, das provas do processo e da aplicação da lei federal, matérias que não são de competência do STF", ressaltou. 

Para o advogado, as previsões genéricas sobre a lei de improbidade traz apenas previsões genéricas sobre atos que causem danos ao erário, enriquecimento ilícito e violação aos princípios da Administração Pública.

O especialista em direito administrativo Pedro Henrique Costódio Rodrigues entende que a ameaça tem um fundo de razão. "A depender do caso concreto e de suas circunstâncias, é possível admitir que o prejuízo causado pela não aplicação da segunda dose caracteriza ato de improbidade administrativa, tanto pela violação de princípios como pelo prejuízo econômico gerado", lembrou. 

Costódio indicou que a fala de Lewandowski pode também ser interpretada como um alerta à necessidade de adoção de medidas mais rápidas e eficientes por parte dos gestores públicos. Mas ambos concordam que a consumação da improbidade administrativa será de caso a caso. 

"A caracterização de ato de improbidade administrativa depende de alguns fatores, dentre eles a verificação do efetivo prejuízo ao erário e das consequências de eventual violação dos princípios da administração pública", ressaltou. "Considerando a situação de emergência e a necessidade de adoção de medidas urgentes, é importante que os órgãos de controle estejam bastante atuantes na investigação dos atos praticados durante a pandemia."


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"Somente o caso concreto e a verificação de que o agente público tenha agido de má-fé permitirá enquadrar ou não a conduta em alguma dessas previsões gerais. Não existe uma previsão expressa no sentido de que deixar faltar vacina significa ato de improbidade", complementa Bento.

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