Petrobras: “Manobra eleitoreira” de Bolsonaro cria provas para processos, dizem juristas

O presidente Jair Bolsonaro, que estimulou investigação contra gestores da Petrobras. /Flickr
O presidente Jair Bolsonaro, que estimulou investigação contra gestores da Petrobras. /Flickr
Presidente do Brasil estimulou investigação contra administradores da petrolífera após nova alta nos preços dos combustíveis.
Fecha de publicación: 22/06/2022

O novo reajuste nos preços de combustíveis anunciado pela Petrobras, na última sexta-feira (17), fez subir a pressão do presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (PL), contra administradores da petrolífera. Bolsonaro defendeu a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar se os gestores da empresa tiveram conduta abusiva ao autorizar reajustes de preços, em meio a uma elevação global nas cotações de petróleo na esteira da Guerra na Ucrânia e dos impactos econômicos da pandemia do coronavírus.

 

A pressão de Bolsonaro fez com que José Mauro Coelho, então presidente da Petrobras, pedisse demissão na segunda-feira (20) e deixou um rastro de provas que podem embasar processos judiciais no Brasil e no exterior, caso investidores busquem o ressarcimento por eventuais perdas provocadas pela interferência política e por eventual represamento de preços, na opinião de juristas entrevistados pelo LexLatin Brasil.


 

Leia também: ANS e rol taxativo: os próximos capítulos no STF


Apesar da pressão do presidente, juristas destacam que a legislação brasileira e o próprio Estatuto da Petrobras impedem que a empresa seja administrada com a finalidade de controlar a inflação. Por lei, gestores precisam perseguir o lucro para acionistas. Por isso, qualquer presidente, diretor ou conselheiro da Petrobras pode ser processado judicialmente e responsabilizado caso não priorize a lucratividade da empresa e a sustentabilidade do negócio, pois essas são condutas proibidas pela Lei das Sociedades Anônimas. 

 

“Essa manobra de Bolsonaro é puramente eleitoreira e absolutamente ilegal. Administradores estão em situação extremamente difícil, pressionados pelo governo federal e pelo Centrão (base parlamentar de Bolsonaro) a segurar preços de combustíveis. Por outro lado, estão com temor justificado de sofrerem ações judiciais aqui e nos EUA para reparar prejuízos causados por segurar os preços de forma artificial e injustificada”, afirmou o jurista Nelson Eizirik, ex-diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e sócio-fundador do Eizirik Advogados. 

 

Bolsonaro passou a atacar reajustes de preços da Petrobras na medida em que sua performance piorou em pesquisas de intenção de voto. Cientistas políticos avaliam essa piora como resultado da avaliação de eleitores que atribuem a Bolsonaro a inflação e outros problemas econômicos. 

 

Para se distanciar dos problemas provocados pela inflação, Bolsonaro tentou negar responsabilidade gerencial pela Petrobras. Só que, como presidente da República, ele é o principal responsável por representar os interesses da União na empresa, consegue nomear a maioria dos cargos do Conselho de Administração da Petrobras e, ao fim, comanda o processo de eleição da diretoria da empresa. 

 

Nos governos presidenciais do PT, a ex-presidente Dilma Rousseff e a Petrobras foram processadas por segurar reajustes de preços enquanto o petróleo subia no mercado internacional. 

 

A empresa também teve de fazer um acordo na Justiça americana e pagar US$ 2,95 bilhões como consequência de uma class action movida por investidores, que tinham responsabilizado administradores da companhia por perdas provocadas pelo esquema bilionário de corrupção descortinado na Operação Lava Jato. Há receio que a interferência de Bolsonaro e de parlamentares aliados venha a criar provas para uma nova class action na Justiça americana.

 

“A Petrobras não é destinada a reter preços e muito menos a assegurar a reeleição de algum presidente”, afirmou Eizirik. 

 

O jurista Carlos Portugal Gouvêa, sócio-fundador do PGLaw e professor da Universidade de São Paulo (USP), ressalta que o cenário internacional, de alta competição por combustíveis, deixa pouca margem de manobra para qualquer administrador e que segurar preços poderia até colocar em risco a capacidade da empresa de abastecer os consumidores brasileiros. 

 

“Qualquer administrador que tenha amor ao seu patrimônio não vai congelar preços, porque uma ação judicial é imediata. Acionistas da Petrobras não são mais passivos. A empresa precisa de dinheiro para comprar combustíveis e sobe todo mês o custo”, avalia Portugal Gouvêa. 


 

Veja também: O papel do gestor jurídico para implementar Diversidade e Equidade


Para o sócio do PGLaw, a condutas de Bolsonaro só deve criar provas a serem usadas eventualmente por investidores em caso de má gestão. 

 

“Estão fazendo um rastilho de provas para que investidores adquiram ADRs na Bolsa de Nova York e entrem com ação dizendo que há ingerência adversa na Petrobras. Mais uma vez nós vamos pagar para os investidores”, diz Portugal Gouvêa. 

 

O advogado Fábio Appendino, sócio do Rolim, Viotti, Goulart, Cardoso Advogados, avalia que represar ou diminuir preços, na contramão do mercado internacional, seria uma razão clara para que administradores sejam processados judicialmente. 

 

“Reduzir o preço para agradar ao controlador seria um ato perfeitamente encaixado na hipótese de responsabilização do administrador”, avalia Appendino. 

 

Para o sócio do Rolim, Viotti, Goulart, Cardoso Advogados, eventual solução para mitigar a inflação dos combustíveis passaria pelo estímulo ao desenvolvimento de refinarias no país e pela privatização da Petrobras. 

 

“O grande problema da Petrobras é a falta de concorrência”, diz. 

 

 

Add new comment

HTML Restringido

  • Allowed HTML tags: <a href hreflang> <em> <strong> <cite> <blockquote cite> <code> <ul type> <ol start type> <li> <dl> <dt> <dd> <h2 id> <h3 id> <h4 id> <h5 id> <h6 id>
  • Lines and paragraphs break automatically.
  • Web page addresses and email addresses turn into links automatically.