Como o 5G vai impactar mercado jurídico?

Para o 5G ter sucesso no Brasil é necessário superar os desafios de implantação da cobertura/Canva
Para o 5G ter sucesso no Brasil é necessário superar os desafios de implantação da cobertura/Canva
Tecnologia virá acompanhada de necessidade de regulação, responsabilidade civil, concorrência e proteção de dados.
Fecha de publicación: 30/01/2022

O primeiro mês do ano já foi e a expectativa em relação a 2022 é enorme no setor de tecnologia. O principal fator que vai fazer a diferença é a promessa de instalação da tecnologia do 5G, pelo menos nas principais capitais brasileiras, até julho, o que vai impulsionar a transformação digital em praticamente todos os setores da economia no país, entre eles o mercado jurídico. 

O 5G vai permitir velocidades até 250 vezes maiores que a do 4G, o que significa mudanças consideráveis no modo de funcionamento dos dispositivos. A tecnologia  deve mudar o modo de utilização da internet por aqui, com downloads mais rápidos, testes de carros monitorados remotamente, desenvolvimento de jogos de realidade virtual na nuvem, utilização da tecnologia pelo agronegócio no manuseio de máquinas e controle de pragas, casas inteligentes e conectadas e uma produção muito maior de dados do que aquela que existe atualmente.


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Uma mudança que pode significar um enorme ganho de produtividade na indústria jurídica. O 5G abre a possibilidade, por exemplo, de os advogados auxiliarem as empresas a se adaptarem ao compliance digital e ao compliance específico da Lei Geral de Proteção de Dados, a LGPD. Há também todo um movimento de construção de instrumentos/contratos por parte dos advogados, para que as empresas regularizem o uso específico dos dados capturados.

“O 5G deve impactar o mercado jurídico de duas maneiras. Primeiro, os escritórios devem continuar investindo em tecnologia e automação de processos. A tecnologia deve impulsionar ainda mais essa evolução, à medida que inovações vão surgindo e maior mobilidade vai sendo alcançada no acesso à internet rápida. Em segundo lugar e ainda mais importante, o mercado jurídico deverá enfrentar novas questões. O 5G pode viabilizar carros autônomos, maior uso de drones, controles automatizados de produção, safra, etc”, diz Ademir Antonio Pereira Junior, sócio da Advocacia Del Chiaro, mestre em Direito, Ciência e Tecnologia pela Stanford University. 

O advogado explica que tudo isso resultará em problemas jurídicos complexos, incluindo necessidade de regulação, questões sobre responsabilidade civil, concorrência e proteção de dados. “Portanto, os advogados precisarão estar aptos a acompanhar esse desenvolvimento e contribuir para as soluções”, diz.

Os especialistas da área explicam que a mudança vai impactar no modo como vivemos em sociedade - desde a forma como interagimos com a tecnologia à mudança de hábitos e costumes "analógicos", incluindo-se telecomunicação, mobilidade, saúde, educação, entretenimento, dentre diversos outros inúmeros aspectos. 

“Isso acarretará numa maior necessidade de flexibilização, de forma a exigir do profissional jurídico 4.0 o raciocínio cada vez mais fora da caixa para enfrentar os desafios mais complexos possíveis decorrentes das situações atípicas do conhecimento jurídico e do direito. Ao profissional será demandada maior postura de business partner, fundamental para a concretização dos negócios, em detrimento ao papel de assessor jurídico ou conselheiro”, avalia José Ricardo dos Santos Luz Júnior, advogado e CEO do Lide China.

Mas apesar da promessa de novas demandas, é bom lembrar, de acordo com os especialistas, que o sistema jurídico nunca fica à frente das mudanças tecnológicas: ele geralmente se atualiza depois que os problemas aparecem.

“Teremos, provavelmente, uma demanda maior de judicialização envolvendo jogos virtuais de videogame, questões de privacidade de dados mais sensíveis nas residências monitoradas, além de temas envolvendo as novas tecnologias que irão surgir e não conhecemos ainda. Isso demandará inicialmente uma postura diferenciada dos juízes que tiverem que tratar do tema e, posteriormente, do legislador que deverá regulamentar as matérias”, afirma Suzana Cencin Castelnau, sócia do Donelli e Abreu Sodré Advogados (DSA).

A forma de implementação da tecnologia 5G está regulamentada e a LGPD também estabelece parâmetros de proteção de dados e direitos pessoais, mas o desafio do sistema jurídico será regulamentar todas as mudanças que isso acarretará para a sociedade: será preciso, por exemplo, avaliar como a internet das coisas vai afetar a privacidade dos indivíduos.

“Uma das formas que o Brasil adota com frequência é se inspirar e se basear em regras que outros países desenvolvem para regulamentação da matéria, como ocorreu no caso da Lei de Arbitragem, da Lei Anticorrupção e mesmo do Código Civil. O desafio é que essa adaptação seja feita de uma forma que se integre ao nosso sistema jurídico para não ser mais uma jabuticaba brasileira, pois as mudanças que virão são inevitáveis", analisa a advogada.

Para Wilson Sales Belchior, sócio do RMS Advogados, a demanda regulatória relacionada aos direitos de exploração das faixas de radiofrequências, velocidade, baixa latência e ampliação da conectividade são, em conjunto, estímulos às transações em meio eletrônico, o que implica no aumento e na diversificação de conflitos oriundos desse espaço. “Outro aspecto se refere ao crescimento das questões de privacidade e proteção de dados ligadas às inovações que usam realidade aumentada e realidade virtual, viabilizadas pelo 5G. E no sistema de justiça certamente o avanço da digitalização dos serviços judiciários", analisa.

O potencial econômico do 5G

No ano passado, o leilão do 5G no Brasil - considerado o maior do mundo do setor - teve como vencedoras seis empresas que levaram a operação da nova tecnologia por R$ 46,7 bilhões. Elas vão operar em quatro faixas de frequência: 700 MHz, 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHz. 

Um levantamento da Ericsson estima um impacto inicial de R$ 153 bilhões em receitas resultantes de digitalização influenciada diretamente pelo 5G. A consultoria internacional IDC (Internet Data Corporation) estima que o valor gerado das tecnologias impulsionadas pela alta conectividade, como internet das coisas (IoT), big data, robótica, inteligência artificial e realidade aumentada devem chegar a R$ 137 bilhões até 2025.

Na agricultura, por exemplo, o 5G deve causar uma enorme transformação ao possibilitar uma transmissão de dados maior, mais ágil e com mais alcance. “Com seu potencial e custo operacional mais baixo do que o 4G, o 5G deve impulsionar a conectividade no campo, possibilitando a implementação de torres de transmissão em áreas mais afastadas. Isso deve refletir em um aumento da adoção de tecnologias, capazes de ampliar fortemente a eficiência do campo”, explica Bernardo de Castro, presidente da divisão de Agricultura da Hexagon - empresa que desenvolve e fornece soluções digitais para o setor.

Segundo o Ministério das Comunicações, o agronegócio deverá ser o segmento mais beneficiado pela tecnologia, considerando que, hoje, cerca de 23% da área rural ainda não tem acesso à internet no Brasil. 

No setor elétrico, a chegada do 5G vai possibilitar uma gestão de energia orientada pela análise de dados. “Por exemplo, o suporte a dispositivos com baixo consumo de energia, alimentados por bateria ou por tecnologias de ‘energy harvesting’ (que converte pequenas quantidades de energia do ambiente, antes desperdiçadas, em eletricidade), permitirá o uso da rede 5G para a instalação de sensores de forma muito mais simples nos consumidores,” afirma Danilo Barbosa, sócio-fundador da Way2, especializada em medição e gerenciamento de dados de energia para empresas, usinas e distribuidoras. 

Em outra ponta, o suporte a volumes maiores de dados por planos acessíveis pode viabilizar aplicações como a discriminação dos dados de energia do consumidor. 

Na área da saúde, o 5G vai agilizar diagnósticos e tornar os tratamentos mais eficazes, além de permitir a disseminação de dispositivos para monitorar os sinais e sintomas dos pacientes e acionar, de forma instantânea, serviços de saúde. “O 5G irá garantir ainda mais qualidade e acesso às teleconsultas e até intervenções cirúrgicas à distância. Esse avanço na conexão vai melhorar toda a experiência de atendimento, sendo possível oferecer um acompanhamento mais personalizado, integrado e com os pacientes como protagonistas neste processo”, diz Gean Pereira, head de inovação da healthtech Zitrus e do hub de inovação Zlabs.

Já no setor financeiro, a chegada do 5G permitirá experiências financeiras no Metaverso. “Será possível melhorar a apresentação de dados, indicadores e a oferta de produtos, que agora podem ser feitos através de ambientes imersivos em realidade aumentada e totalmente integrados, através da combinação Metaverso + open banking”, analisa Bruno Imhof, CTO e Co-founder da CashWay, empresa de tecnologia para fintechs. 


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Além dessas mudanças, o 5G vai trazer negócios e potencialidades que só serão percebidos daqui a algum tempo, quando a infraestrutura existir e quando as pessoas perceberem as utilidades que vão estar disponíveis. Tudo isso pode gerar toda uma demanda de novos processos.

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