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O Plenário Virtual do STF (Supremo Tribunal Federal) definiu que é vedado aos estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD (Imposto sobre a Transmissão de Causa Mortis e Doações) de bens no exterior, sem a intervenção da lei complementar. A corte tomou a decisão em um caso envolvendo o estado de São Paulo e uma recipiente de bens situados na Itália.
A Corte debateu a questão no RE (Recurso Extraordinário) 851.108, que trata da cobrança do ITCMD sobre doações ocorridas no exterior. O julgamento teve repercussão geral e foi definido pelo placar de 7x4.
No caso do RE, o estado de São Paulo disputa o direito de tributar o ITCMD de um imóvel localizado na cidade de Treviso, no nordeste da Itália, assim como uma quantidade de dinheiro repassado por um residente italiano a uma herdeira brasileira. Os bens, apontam os autos, foram declarados no Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) de 2006 e já teriam seus valores tributários recolhidos pela República Italiana. O total de R$ 528 mil em ativos doados gerou cerca de R$ 21,1 mil em ITCMD à época. À época do recurso no Tribunal de Justiça, segundo a recorrida, já passavam de R$ 54 mil.
O relator do caso, ministro Dias Toffoli, votou contra o recurso movido pelo estado de São Paulo e reconheceu a impossibilidade de cobrança de doador residente no exterior enquanto não houver lei complementar federal que regulamente o tema. Toffoli, entretanto, votou por modular os efeitos para depois da publicação do acórdão.
O ministro Dias Toffoli disponibilizou o seu voto no site do STF. No seu entendimento, uma demora de "mais de 25 anos" em regulamentar o tema por lei complementar por parte do Poder Público federal gerou a confusão, a ponto de estados já terem baixado leis regulamentando a cobrança do ITCMD antes da promulgação de uma lei complementar.
Foi exatamente o que aconteceu em São Paulo, que aprovou a Lei 10.705 ainda no ano de 2000. "A Constituição de 1988 não concedeu aos estados a competência para instituir o ITCMD nessa hipótese, pois tal competência deve ser regulada por lei complementar", apontou o ministro. Com isso, propôs a tese: "É vedado aos estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no art. 155, § 1º, III, da Constituição Federal sem a intervenção da lei complementar exigida pelo referido dispositivo constitucional."
Para julgar pelos efeitos ex nunc da decisão, Toffoli argumentou que não se é possível declarar a inconstitucionalidade de leis estaduais que regulamentam o recolhimento do ITCMD, sob risco de inviabilizar a cobrança pelo agente público. O estado de São Paulo poderia ter perdas de R$ 5,4 bilhões, a maioria de forma imediata.
Leia também: Projeto prevê mudanças no ITCMD em SP e aumento de tributação
Para o ministro, há também jurisprudência da Corte no sentido de que os estados, com base na competência legislativa plena, editarem leis prevendo a cobrança do ITCMD sobre doações ou bens objetos de herança provenientes do exterior.
"Antes de seu implemento, descabe a exigência, visto que os estados não dispõem de competência tributária para suprir a ausência de lei complementar nacional exigida pelo artigo 155, § 1º, inciso III da Constituição Federal", explicou o ministro em seu voto.
Seu entendimento foi acompanhado pela ministra Rosa Weber e pelos ministros Luís Roberto Barroso, Nunes Marques e Ricardo Lewandowski – que foi contra a proposta de Toffoli para exigir que o poder Legislativo regule o tema.
Corrente divergente
O caso teve o julgamento iniciado no final de outubro, mas foi suspenso para vista do ministro Alexandre de Moraes. Seu retorno, no final de fevereiro, foi divergindo do relator e deu provimento ao recurso dos estados.
"Está claro que as Unidades da Federação suportariam individualmente sérios prejuízos em sua arrecadação fiscal, caso esta Suprema Corte venha a manter o entendimento do tribunal de origem pela impossibilidade do exercício da competência tributária plena pelos Estados e o Distrito Federal", avaliou o ministro. Moraes propôs tese para garantir tal competência plena aos estados.
Acompanharam o voto divergente a ministra Cármen Lúcia e os ministros Luiz Fux e Gilmar Mendes. Uma terceira corrente com os ministros Marco Aurélio e Edson Fachin negou provimento ao recurso de São Paulo, mas discordou da possibilidade de apelo ao Legislativo e de modulação ex nunc dos efeitos.
Para a advocacia, mudanças foram positivas
A mudança de voto do relator foi positiva na visão de tributaristas. "Um dos pontos positivos do julgamento foi o reajuste do preocupante voto proferido inicialmente pelo ministro relator Dias Toffoli, o qual previa que o entendimento do STF somente deveria operar efeitos para os fatos geradores ocorridos após a publicação do acórdão", disse o advogado tributarista do Ogawa, Lazzerotti e Baraldi Advogados, Gustavo Vita Pedrosa.
O julgamento ganhou relevância como uma possibilidade da discussão sobre a tributação de grandes fortunas – defendidas por setores mais à esquerda e que está inclusive previsto na Constituição.
Eduardo Muniz, que é sócio da Bento Muniz Advocacia, aponta que a discussão do caso não se trata de um "caminho indireto" para se exercer a cobrança do imposto sobre grandes fortunas. "A tributação sobre grandes fortunas é uma discussão própria e que precisa ser enfrentada diretamente pela atividade legislativa", argumentou o advogado.
Muniz considerou a decisão tecnicamente possível, mas "criativa". Com a decisão, argumenta o tributarista, Dias Toffoli "reconhece a inconstitucionalidade da cobrança pelos estados membros do ITCMD, porém mantém a cobrança do tributo sobre os fatos geradores ocorridos até a publicação do acórdão, assegurando, com isso, a previsão orçamentária de receitas advindas da correspondente tributação aos entes federados."
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