Mulheres empreendedoras: as leis que promovem as PMEs no Brasil, Equador, Honduras e El Salvador

Existem vários programas para promover o empreendedorismo feminino nos países da América Latina e do Caribe./Unsplash - Allan Lainez.
Existem vários programas para promover o empreendedorismo feminino nos países da América Latina e do Caribe./Unsplash - Allan Lainez.
O acesso ao financiamento, o limite de idade e os regulamentos complicados são apenas alguns dos pontos de atenção da desigualdade ao fazer negócios.
Fecha de publicación: 07/03/2023

A América Latina e o Caribe têm uma das taxas mais altas de atividade empreendedora, liderando em intenções e atividades para iniciar novos negócios, de acordo com o Global Entrepreneurship Monitor. Mas o que acontece se revisarmos essa vertical a partir de uma perspectiva de gênero? O informe GEM 2021/22, Women's Entrepreneurship Report From crisis to opportunity revisou os casos de Brasil, Chile, Colômbia, República Dominicana, Guatemala, Panamá e Uruguay, concluindo que, apesar dos avanços, há grandes disparidades sobre a participação das mulheres na região.

Entre outras conclusões, o principal desafio da região é identificar os elementos nos ecossistemas que podem ser úteis para aproveitar os altos índices de intenção de iniciar um negócio por parte das mulheres, para reduzir os níveis de interrupção de seus negócios.

Deste lado do mundo, mulheres e homens se comprometem a ganhar a vida na ausência de oportunidades de crescimento profissional. Mas o que os governos e legisladores de alguns países latino-americanos têm feito para apoiar o impulso empreendedor e o que resta fazer?

Brasil

No Brasil, existem várias iniciativas governamentais e privadas voltadas para a promoção do empreendedorismo feminino. Um dos mais recentes é o “Brasil pra Elas”, criado por decreto em 8 de março de 2022 como política pública iniciada pelo Governo Federal com apoio da iniciativa privada.

Outros programas são promovidos pelo Governo, em parceria com instituições privadas e não governamentais, como o Caravana para elas (Sebrae), Programa Mulheres Inovadoras (Finep), Plano de Políticas de Equidade de Gênero e Valorização da Diversidade, uma iniciativa do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES e da iniciativa privada como Parceiros em Ação, uma iniciativa do Banco Santander e Accenture, em parceria com a Aliança Empreendedora, e Caixa para Elas Empreendedora, da Caixa Econômica Federal (Caixa).

Mais recentemente, outras iniciativas foram agregadas, como um grupo de estudos criado no início deste ano entre o BNDES, o banco de desenvolvimento alemão KfW e sua compatriota, a agência de cooperação internacional GIZ para avaliar a implementação de um fundo de financiamento voltado para micro, pequenas e médias empresas para mulheres empreendedoras.

Como iniciativas legais, destacam-se os projetos de lei 1883/2021, 2589/2021, 1912/2022 e 573/2023.

Liliam Yoshikawa, sócia do Machado Meyer, acredita que muito mais do que a existência ou ausência de normas, o que mais cria obstáculos à maioria das mulheres ao empreendedorismo e à obtenção de crédito são a falta de informação e a ausência de uma rede de apoio, além de um certo preconceito e descrédito pela sociedade como um todo que ainda minam a autoestima e confiança de muitas mulheres.

“Também não basta apenas a obtenção do crédito inicial para empreender uma ideia de um bom negócio. É necessária a formação e o suporte para que este negócio prospere e cresça a fim de que o crédito possa não apenas ser pago, mas gerar frutos para expansão”, afirmou a advogada.

Ela argumenta que o ponta pé inicial é uma formação adequada e constante, ou seja, não apenas no lançamento da ideia ou da constituição da empresa e do negócio, mas também o acompanhamento para o suporte à identificação das falhas, implementação de alternativas para correção e o constante aprendizado da empreendedora para que adiante consiga seguir de forma autônoma. 

Para ela, as iniciativas que estão sendo criadas para o empoderamento das mulheres são vitais para o desenvolvimento social e sustentável.

“Nosso país conta com muitas mulheres ocupando a posição de chefes de família e a formação e apoio para que essas mulheres se desenvolvam e se capacitem deve ser um dos pilares de nossa política social”, acrescentou.

O Machado Meyer possui programas de assessoria pro bono que incluem apoio jurídico a pequenos negócios que necessitem de suporte na elaboração e negociação de contratos de crédito, constituição de empresas, entre outros.

Além disso, o escritório apoia financeiramente projetos de organizações do terceiro setor voltados à educação, incluindo programas de apoio educacional para meninas estudantes e de qualificação e desenvolvimento profissional para mulheres, que se encontram em situação de vulnerabilidade socioeconômica.


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El Salvador

Em El Salvador, as mulheres desempenham um papel muito importante na economia: 64% das empresas criadas são dirigidas por mulheres. Isso equivale a 1 milhão de empregos, segundo Susana de Tablas, sócia do Consortium Legal no país.

Nesse país, o governo central e os municípios têm articulado programas para ajudar as mulheres por meio de financiamento, orientação comercial, entrada no comércio eletrônico e para que possam transcender com inovações nos mercados internacionais (em cumprimento ao artigo 115 da Constituição e à Lei de a promoção da proteção e desenvolvimento das micro e pequenas empresas e com o apoio da Comissão Nacional da Micro e Pequena Empresa - Conamype).

Tanto o Conamype quanto a Lei de Promoção da Proteção e Desenvolvimento das Micro e Pequenas Empresas datam de 2014. Três anos antes, o país aprovou a Lei de Igualdade, Equidade e Erradicação da Discriminação contra a Mulher.

“O dinamismo das mulheres é muito importante para o PIB. Aos poucos, estão sendo criados espaços para que as mulheres continuem contribuindo significativamente para a economia”, afirma a advogada.

A especialista acredita que há 15 anos é dado maior destaque a este grupo populacional e recentemente têm-se feito esforços para promover as mulheres artesãs e as que se dedicam à indústria da moda e da alimentação.

O apoio inclui formação técnica e jurídica sobre os regulamentos que regem a criação e o funcionamento de uma empresa. Conhecimento sobre ciência e tecnologia, assessoria em questões empresariais, desenvolvimento de presença digital, criação de marcas, desenvolvimento de microfranquias e quadro técnico de educação permanente para que tenham uma atividade econômica um pouco mais estruturada.

De Tablas identifica que o ponto fraco desse esforço está nos empréstimos. Apesar de existirem linhas de crédito para empreendedores, ela garante que é extremamente difícil para eles acessar financiamento para ter capital inicial. Uma limitação também é a idade para solicitar empréstimos e cartões de crédito.

Financiamento insuficiente se soma à exigência de muita burocracia, o que acaba desestimulando o talento.

Como solução, a sócia do Consortium Legal acredita ser fundamental que haja um arcabouço legal e normativo que possa transformar produtivamente os microempreendedores para que tenham maior competitividade, produtividade e sustentabilidade, algo que perpassa a questão da tributação em menor escala (ou seja, pagamento de impostos, declaração de vendas para comerciantes e empresários com renda mensal superior a 5.714 dólares), o que permite às microempresas formalizar o acesso à banca pública e privada.

Honduras

Em Honduras há uma mulher na presidência e na Suprema Corte de Justiça, eleita recentemente, há uma representação de mulheres superior a 50%.

Nesse país, várias leis foram publicadas com o objetivo de equilibrar a balança para as mulheres, como a Lei da Igualdade de Oportunidades da Mulher (e sua regulamentação) e a Lei do Instituto Nacional da Mulher (INAM), que cria um programa de atendimento integral, incluindo módulos de autonomia econômica (orientação profissional, assistência empresarial por meio de MPMEs, capacitação por meio de oficinas vocacionais, habilidades para a vida, cursos de empreendedorismo e educação financeira e obtenção de financiamento para capital inicial, tramitação de documentos) e inovação (serviços de desenvolvimento de negócios e um ambiente favorável para líderes empresariais hondurenhas de MPMEs).

Sandra Amaya, associada do Consortium Legal, detalha que a lei de apoio ao empreendedor prevê a desoneração do imposto sobre vendas e imposto de renda por cinco anos a partir do início do negócio. Além disso, organizações empresariais em Tegucigalpa e na área de Cortés apoiam empresas de mulheres com treinamento em criação de empresas e acesso a empréstimos.

No entanto, em Honduras, como em El Salvador e, como logo veremos, no Equador, o grande obstáculo para abrir um negócio é o acesso a empréstimos, e não apenas pelas altas taxas (entre 12% e 50%), mas também pelo número de requisitos solicitados. A isso se acrescenta que, como em El Salvador, há um limite de 50 anos para acessar esses créditos.

Desde 2018, o Consortium Legal conta com um comitê de igualdade de gênero que defende políticas de igualdade na região da América Central. Ayala indicou que, como uma colaboração pro bono, o escritório reúne empreendedoras com deficiência para formar empresas.


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Equador

Quando se revisa esse tema, uma constante é a falta de financiamento, entraves burocráticos e legais.

“O acesso ao crédito ainda é menor para as mulheres do que para os homens. Continua havendo uma diferença significativa, em torno de 10%, entre mulheres e homens bancarizados", diz Carmen Simone Lasso, sócia da Pérez Bustamante & Ponce, no Equador.

No Equador, no ano passado, pela primeira vez, foram concedidos mais empréstimos a mulheres (0,2% a mais) do que a homens.

Tanto o Executivo quanto o Legislativo têm promovido diversas iniciativas de apoio às mulheres empreendedoras. Uma das mais recentes é a Lei da Economia Lilás, em vigor desde janeiro passado. Isso inclui benefícios voltados para mulheres e empresas que as incluam em seus quadros e em seus conselhos como potenciais sócias; lhes dá acesso a linhas de crédito e incentivos fiscais para contratação. No entanto, essa lei ainda carece de regulamentação.

Por outro lado, segundo a especialista, a Lei de Empreendedorismo e Inovação introduziu uma mudança "revolucionária": a criação da sociedade anônima simplificada, que facilitou o processo de constituição de empresas e reduziu custos, fazendo com que se criem muito mais empresas com mulheres à frente, hoje líderes do Cadastro Nacional de Empreendedores do Ministério da Produção.

A sócia do PBP aponta que todas as formas alternativas de financiamento encontram obstáculos regulatórios no Equador. Por exemplo, embora a Lei de Empreendedorismo e Inovação reconheça o crowdfunding como um mecanismo para financiar o empreendedorismo, e a recente aprovação da Lei Fintech permitirá que empresas dessa categoria venham ao país, para oferecer produtos e serviços financeiros mais modernos, ágeis e mais próximos aos clientes, eles ainda possuem regras que dificultam o alcance desse objetivo pelos empreendedores.

Um aspecto crucial para revisar essa questão no Equador é a simplificação tributária, necessária para procedimentos e autorizações para facilitar os negócios. Para Carmen Simone, quase se requer um título de PhD para tentar cumprir as obrigações fiscais no Equador, país que as Big Four colocam como o que tem as exigências mais difíceis de cumprir.

Simplificar o sistema tributário e torná-lo mais acessível às pessoas é uma oportunidade de melhoria. Em sua opinião, muitos benefícios são desperdiçados hoje por desconhecimento, por não serem divulgados ou por serem complicados de aplicar.

Um dos regimes tributários que tem golpeado o ecossistema empreendedor é o RIMPE, em vigor desde janeiro de 2022 e parcialmente anulado pelo Tribunal Constitucional em relação aos negócios populares, que faturam menos de 20 mil dólares.

“Na prática, passamos de um sistema fiscal em que o empresário podia deduzir as suas despesas para um sistema de rendimento mínimo ou presumido onde se paga um valor fixo que nem sempre o empresário está em condições de pagar e que é míope face à situação específica de certos empreendimentos que nos primeiros anos só perdem e não têm utilidade”, disse.

Ela comenta que, a pretexto de instituir um regime mais benévolo e mais simples, passaram de um regime em que pagam obrigatoriamente impostos sobre o rendimento bruto, sem considerar qualquer tipo de despesa e que os afetou enormemente.

Apesar dos avanços, o especialista diz que ainda há muito a ser feito, principalmente considerando que os bancos pedem a assinatura dos maridos para conceder crédito às mulheres casadas. Além disso — lembra o especialista — as solteiras, as viúvas e as divorciadas são vistas com ceticismo, já que "não têm esse apoio atrás delas".

Até 1987, presumia-se que os homens administravam a sociedade conjugal, por isso as mulheres casadas tinham de ter autorização dos maridos para fazer negócios.

“Isso colocava a mulher na condição de quase subcidadã”, comenta a advogada.

Lasso reconhece o trabalho realizado por organizações feministas para tornar visível seu papel como agentes econômicos e como provedoras, para além dos papéis tradicionais de cuidadoras, apenas vinculadas ao lar.

*Com o apoio de Luiza Santibañez Nogueira.

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