A mudança foi sutil, mas muito significativa para quem precisa registrar direitos autorais no Brasil. Desde 3 de outubro do ano passado, o Escritório de Direitos Autorais da Biblioteca Nacional começou a digitalizar os processos de requerimento de registros autorais. Com isso, todo o caminho para o reconhecimento da obra intelectual pode ser feito a partir da plataforma do governo federal (Gov.br), o que já ajuda, e muito, os autores do país.
Até então, todo o processo de registro era um pouco mais burocrático. Além da necessidade do preenchimento físico do formulário de requerimento de registro e do pagamento da taxa, somente era possível fazer todo o processo de forma presencial, na sede do Escritório de Direitos Autorais no Rio de Janeiro ou em um dos postos avançados estaduais, ou ainda, via correio, modalidade que não permitia obter o comprovante de entrega dos documentos. Hoje, o prazo oferecido para efetivação do registro é de 180 dias, mas em muitos casos a demora se arrasta por anos, o que prejudica o ambiente de negócios, que depende de inovação.
“É comum observarmos autores buscando obter tal registro, já que pode ser uma forma de formalizar a criação e atrelá-la a uma data no tempo, o que por sua vez pode vir a ser importante em eventuais disputas envolvendo o conteúdo criado. Uma desvantagem na obtenção do registro autoral, no entanto, era a burocracia envolvida no procedimento – até então arcaico – de recebimento da documentação necessária pelos órgãos competentes, principalmente a Biblioteca Nacional”, explica Aline Pimenta Passos, advogada da equipe de Propriedade Intelectual do escritório Siqueira Castro Advogados.
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“O registro garante ao seu titular maior segurança jurídica e, como consequência, tem o condão de evitar ou provar a autoria do titular da obra, caso haja, por exemplo, disputa judicial. A mudança, sem dúvida, é muito positiva, pois além de facilitar e incentivar os autores a realizarem o pedido de registro, também irá acelerar e reduzir o processo de análise da solicitação”, avalia Daniela Favaretto, sócia especialista em Contratos e Fashion Law do Chiarottino & Nicoletti Advogados.
O direito autoral no Brasil nasce com a criação da obra pelo autor e independe de registro formal. Mas o registro o protege de eventuais questionamentos e dá segurança jurídica aos direitos morais e patrimoniais do autor de uma obra intelectual (obra literária, artística, científica ou qualquer outra espécie de criação intelectual), segundo a Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998.
A norma define que o autor, que possui os direitos morais e patrimoniais de sua criação (com registro ou não de sua obra junto a um órgão público responsável), precisa autorizar previamente qualquer reprodução, distribuição e alteração de uma obra intelectual. A lei também se aplica para o titular de direitos autorais transferidos por contrato (cessão) ou herança. A mesma lei define que as obras caem em domínio público 70 anos após o falecimento do autor, com exceção para as criações audiovisuais e fotográficas, protegidas por 70 anos a partir de 1º de janeiro do ano seguinte à sua divulgação.
A Biblioteca Nacional é responsável pelo registro de obras intelectuais por aqui desde 1898, quando foi publicada a primeira lei específica brasileira sobre direitos autorais. O serviço permite o registro e a publicação das informações legais declaradas pelo autor/titular no requerimento de registro, conforme cópia da obra intelectual, que precisa ser entregue à Biblioteca mesmo com o registro online. Isso garante a preservação da cópia da obra intelectual registrada pelo prazo de duração dos direitos patrimoniais, para consulta e referência futura, ressalvadas as restrições de acesso às obras inéditas, em atenção aos direitos morais do autor.
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Em casos de mudança no registro, a chamada averbação, a Biblioteca Nacional também precisa ser notificada. Isso acontece quando há modificação das informações legais do registro por causa de novos fatos, como, por exemplo, a alteração do título da obra ou a transferência de titularidade através de contrato de cessão de direitos autorais patrimoniais.
Para os advogados de Propriedade Intelectual ouvidos pela LexLatin, é grande a chance de o tempo médio do registro feito de forma online diminuir, porque já é possível ver que o processo tem se tornado mais transparente. De acordo com dados públicos divulgados pelo governo federal, desde a mudança e a digitalização, foram 250 novos requerimentos feitos à Biblioteca Nacional.
“Em que pese o sítio eletrônico oficial ainda não disponibilizar a estimativa de tempo, é de se esperar que o mesmo seja sensivelmente menor que o anterior. A mudança é um grande passo na desburocratização do procedimento de registro e, para além da celeridade, atrai maior segurança jurídica. O criador/titular poderá contar com um mecanismo expressamente previsto na legislação, sendo um possível facilitador quando diante de demandas judiciais. Descortina-se um cenário de potencial melhoria para a sistemática de registro no território brasileiro, como forma de reforço declaratório à delimitação temporal da autoria/criação de obras intelectuais protegidas por direitos autorais”, afirma Raul Murad Ribeiro de Castro, professor da PUC-Rio e sócio do Denis Borges Barbosa Advogados.
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