Orçamento e PEC dos Precatórios: A terça de vitórias e derrotas do governo e do Legislativo

Votação em 2º turno da PEC dos Precatórios teve 323 votos favoráveis/Câmara dos Deputados
Votação em 2º turno da PEC dos Precatórios teve 323 votos favoráveis/Câmara dos Deputados
STF forma maioria contra orçamento secreto e Câmara aprova texto favorável ao governo.
Fecha de publicación: 09/11/2021

O governo federal e a Câmara dos Deputados se viram, no final da noite desta terça-feira (9), com vitórias e derrotas nos dois temas mais importantes da semana para o horizonte político do país no curto prazo. O STF (Supremo Tribunal Federal) formou maioria de votos para impedir que emendas parlamentares sejam distribuídas em uma espécie de orçamento secreto, sem transparência de sua divisão. 

Ao mesmo tempo, a Câmara aprovou uma proposta polêmica que permite ao governo renegociar títulos judiciais já vencidos, e que pode abrir caminho não apenas para um novo programa social mais polpudo e de menor duração, como também pode turbinar as próprias emendas parlamentares. 


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A votação em 2º turno da PEC dos Precatórios, por 323 votos favoráveis, ocorreu de maneira mais tranquila que o 1º turno, e mostrou que o governo e sua base ainda possuem uma capacidade significativa de coalizão dentro da Casa.

No STF, maioria formada contra orçamento secreto

Em uma decisão que poderia durar dois dias - mas acabou resolvida mesmo em cerca de 17 horas - o plenário do STF formou maioria para suspender o pagamento das chamadas “emendas de relator”. Criado no primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro, o dispositivo centraliza, na cúpula do Congresso Nacional, uma parte relevante das verbas destinadas a obras de infraestrutura e investimentos em saúde e educação em redutos de deputados.

O que a imprensa revelou, no entanto, é que as emendas serviriam para a compra e manutenção do apoio de deputados às pautas do governo. Senadores e deputados federais mais alinhados aos votos do governo federal receberam maiores valores. Nenhum deles negou, à época, terem recebido os montantes - que passavam das dezenas de milhões, em alguns casos.

O caso levado à corte foi uma ADPF do Psol, apresentado ainda em junho. A pouca transparência na distribuição do dinheiro seria, na visão do partido, uma quebra do princípio constitucional da isonomia. “[A obrigação de uma execução] não deveria depender do autor da iniciativa, de seu partido político e da localização da programação”, pontuou André Maimoni, que assina a petição inicial. “Deste modo as emendas parlamentares, mesmo a de relator-geral, não são, sob pena de subversão das conclusões na execução orçamentária, um atributo do parlamentar.”

O julgamento da liminar foi aberto às 0h desta terça-feira (8), com o voto da relatora, Rosa Weber: tal como na sua decisão monocrática e liminar na última sexta-feira (5), Rosa manteve sua decisão de suspender o repasse por meio do RP-9 neste ano, e cobrar maior transparência e publicidade nas decisões sobre o tema. 

“Mostra-se em tudo incompatível com a forma republicana e o regime democrático de governo a validação de práticas institucionais adotadas no âmbito administrativo ou legislativo que, estabelecidas à margem do direito e da lei, promovam segredo injustificado sobre os atos pertinentes à arrecadação de receitas, efetuação de despesas e destinação dos recursos públicos”, escreveu a ministra em seu voto, “com evidente prejuízo do acesso da população em geral e das entidades de controle social aos meios e instrumentos necessários ao acompanhamento e à fiscalização da gestão financeira do Estado.” 

A ministra Cármen Lúcia acompanhou seu voto, e foi ainda mais enfática: “O Estado põe-se a serviço dos cidadãos – e somente por isso se justifica– , e como tal deve satisfação de seus atos”. Até o início da noite, os ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes haviam votado com Rosa Weber. 

Gilmar Mendes foi a única divergência clara. O ministro concordou com a ordem de transparência feito pela relatora, mas considerou temerário suspender o repasse de emendas tão bruscamente.

 “O congelamento das fases de execução dessas despesas se afigura dramático principalmente em setores essenciais à população, como saúde e educação”, argumentou o decano da corte. “São recursos destinados à construção de hospitais, à ampliação de postos de atendimento ou a quaisquer outras finalidades de despesa primária que podem ser destinados a todas as unidades federativas nacionais e que terão sua execução simplesmente paralisada até o julgamento de mérito desta ADPF.”

A decisão foi recebida de maneira dividida na Câmara dos Deputados, onde as emendas de relator mais circulam. A deputada Joice Hasselmann (PSDB-SP), que passou de aliada a crítica de Bolsonaro, elogiou a decisão da corte. “O que o supremo fez hoje, de maneira muito acertada, seguindo a votação da ministra Rosa Weber, foi desmontar, através da publicização de informações, o mensalão bolsonarista”, disse a deputada, utilizando do apelido “Bolsolão” que começou a pegar entre opositores. 

Já os deputados da base de apoio ao governo entenderam na decisão do STF uma intromissão indevida no Legislativo: “Não há segredo nos recursos, onde são disponibilizados; não há segredo na execução” defendeu Hugo Leal (PSD-RJ), que relator do Orçamento de 2022. “Nós não podemos aceitar, repito, como todas as vezes, nós não podemos aceitar que outro órgão legisle por nós. Não podemos aceitar isso! Isso é, sim, uma caça às prerrogativas.”

Na Câmara, mudanças não impediram avanço da PEC dos precatórios

Com a maioria formada no STF, os deputados entraram no debate sobre o segundo turno da PEC 23, que altera as regras para pagamento de precatórios pela União. A votação, desta vez, envolveu menos tensão que a primeira rodada, realizada na semana passada: no primeiro turno, o texto havia aprovado com extrema dificuldade, tendo 312 votos favoráveis e 144 contra - pouco acima dos 308 necessários para aprovar uma emenda constitucional.

Mesmo com o resultado favorável, a base do governo foi obrigada a agir sob pressão de partidos que mudaram de ideia sobre o tema: o PDT, partido com 25 deputados que é de oposição ao governo, deu parte dos seus votos à proposta, o que gerou a ira de parte dos deputados, e mesmo o pré-candidato à presidência do partido, Ciro Gomes, suspendeu suas tratativas por conta da votação. O PSB, outro partido de oposição, passou a defender a rejeição do texto.

O líder do partido, Wolney Queiroz (PE), explicou a mudança do partido sobre a PEC. “Chegamos hoje à votação do segundo turno, e a nossa bancada, reunida ontem à noite, deliberou pela mudança de posição”, explicou o deputado. O motivo, apontou, seria de princípios partidários: “a razão fundamental dessa mudança foi a manutenção da tão cara unidade partidária. Nós não poderíamos jogar por água abaixo uma construção partidária de tantos anos.”


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Enquanto a oposição passava o dia contando votos, alguns grupos fizeram pressão pela aprovação do texto. A CNM (Confederação Nacional dos Municípios), que é a favor do texto, levou prefeitos à Câmara dos Deputados durante todo o dia. O texto da PEC dos Precatórios tem um dispositivo que passa a permitir o refinanciamento de municípios que aprovaram reformas de previdência municipal em suas câmaras.

O texto agora deverá seguir para o Senado, onde precisará passar por duas novas votações de 54 votos cada. Mesmo deputados da oposição, ouvidos reservadamente pela reportagem, apontam que no Senado o caminho para a PEC deve ser mais tranquilo que os debates já travados na Câmara dos Deputados.

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