Rol taxativo da ANS: por que planos de saúde comemoram decisão do STJ

Os pacientes ainda podem buscar o Judiciário para questionar a decisão e pedir a realização de tratamentos/Pixabay
Os pacientes ainda podem buscar o Judiciário para questionar a decisão e pedir a realização de tratamentos/Pixabay
Revisão do entendimento é considerada uma vitória para as operadoras de planos de saúde e uma derrota para os diversos pacientes que necessitam de tratamentos.
Fecha de publicación: 10/06/2022

Empresas e consumidores foram inversamente afetados pela decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que definiu que planos de saúde não precisam cobrir procedimentos fora da lista da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A consolidação desse entendimento é considerada uma vitória para as operadoras de planos de saúde e uma derrota para os diversos pacientes que necessitam de tratamentos ausentes no rol da agência. 

Antes da decisão da semana passada, o STJ tinha inúmeras decisões em sentidos opostos. Enquanto alguns acórdãos tratavam o rol da ANS como o piso mínimo de coberturas a serem oferecidas pelos planos, outras decisões consideravam o rol como taxativo, logo nada além do previsto precisava ser garantido aos consumidores

Com o novo entendimento, salvo em casos excepcionais, as operadoras de saúde não precisam custear os tratamentos que não estejam descritos na listagem da ANS, desde que nela constem alternativas de procedimentos igualmente eficazes e que já estejam incorporados ao rol. 


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Clientes de planos ainda podem buscar o Judiciário para questionar a decisão e pedir a realização de tratamentos, mas advogados veem menos chances de vitória judicial quando o tratamento médico pretendido não constar do rol da ANS e quando não houver um procedimento similar. 

“Conclui-se, assim, que na realidade o entendimento adotado pelo STJ consiste em uma taxatividade que pode ser mitigada, na medida em que ela permite exceções. Contudo, de acordo com o entendimento dos ministros, a excepcionalidade não encontra amparo em simples recomendação médica para a realização de determinado tratamento. Ela não é suficiente para obrigar as operadoras de saúde a arcarem com o custeio do procedimento médico”, explica Luciana Goulart, sócia fundadora do escritório Goulart Penteado.

Como forma de resguardar o direito dos participantes dos planos de saúde a terem acesso às coberturas excepcionais, a decisão do STJ concede uma permissão para que as operadoras implementem a contratação de uma cobertura ampliada ou a celebração de aditivos contratuais que possam conceder a cobertura de procedimentos não constantes da listagem.

“A decisão, além de restringir a quantidade de tratamentos a serem cobertos pelos planos de saúde, conflita com o entendimento que vinha sendo praticado para as demandas individuais que objetivavam, pela via judicial, obrigar as operadoras de plano de saúde a custearem procedimentos não previstos no rol de coberturas mínimas da ANS”, afirma Desirreé Franco, sócia no Goulart Penteado Advogados.

Vale lembrar que, por meio da Súmula nº 102, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, entende-se que, havendo  indicação médica, é considerada abusiva a não cobertura de custeio de tratamento sob o argumento de que seria de natureza experimental ou, ainda, sob a premissa de que não estaria previsto no rol de procedimentos da ANS.

“Não à toa que, desde o início do julgamento ocorrido no ano passado, o caso fomentou a opinião pública, tendo havido, inclusive, manifestações em frente ao STJ nos dias de julgamento, em defesa da manutenção do rol exemplificativo. Isso porque, ao tornar a listagem taxativa, muitos participantes poderão ter tratamentos suspensos sob a premissa de ausência de cobertura”, analisa Luciana Goulart.

Os ministros do STJ argumentaram que o rol taxativo garantiria segurança jurídica para as partes, ao considerar que as empresas terão maior previsibilidade sobre os fatores que tenham relação com os reajustes e o índice de sinistralidade. Com isso, poderão precificar os serviços com mais rigor, sem onerar demasiadamente os consumidores, ainda de acordo com o argumento dos ministros que votaram favoravelmente ao rol taxativo.

Só que, no fim das contas, mesmo com a intenção de pacificar o entendimento até então divergente de turmas de Direito Privado do STJ, o julgamento acabou por acirrar a polêmica e pode aumentar as demandas judiciais sobre a cobertura de tratamento médico pelas operadoras de saúde no país.

De acordo com os especialistas, as ações que antes falavam em abuso das operadoras em negar determinados tipos de tratamento médico serão agora incrementadas pela discussão sobre quais tratamentos poderão ser, ou não, enquadrados na exceção ao rol taxativo tratado pelos Ministros do STJ na decisão.

“A sensação que se tem, nesse primeiro momento, é a de que o participante do plano de saúde que necessitar buscar no Judiciário a concessão para realizar qualquer tipo de tratamento excluído do rol da ANS precisará obter um laudo aprimorado e elaborado por profissional médico experiente e capacitado, que torne inquestionável o fato de que o procedimento cabível para a cura da enfermidade não possui cobertura e nem mesmo tratamento similar previsto no rol da ANS”, avalia Luciana Goulart.

A advogada explica que, apesar de ser possível a concessão judicial para a celebração de procedimento médico a cargo das operadoras, que não esteja elencado no rol da ANS, a decisão pode complicar a vida dos pacientes que eventualmente necessitarem de uma solução mais rápida para o tratamento.

Alguns advogados alegam que a decisão poderia até beneficiar os consumidores, na medida em que as operadoras de saúde terão maior previsibilidade dos fatores que embasam os seus custos. Há também expectativa de maior rigor na inserção de tratamentos no rol de cobertura obrigatória pelos planos de saúde.

“A considerar esse cenário, não haveria qualquer desequilíbrio financeiro às operadoras de plano de saúde, nem tampouco prejuízos efetivos ao consumidor, seja de ordem financeira, pela não aplicação de reajustes elevados, seja pela garantia da prestação dos serviços e respectiva cobertura médica”, afirma Desirreé Franco.

Embora a decisão do STJ tenha buscado firmar jurisprudência a ser seguida em julgamentos de tribunais inferiores, o posicionamento da Corte não é vinculante, segundo advogados da área.

“Isso porque os tribunais de justiça têm competência para deliberarem sobre os conflitos que são submetidos à sua apreciação, logo, os juízes poderão exercer sua atividade jurisdicional nos limites da lei e sentenciar os pedidos de acesso a determinado tratamento médico enumerados nas ações judiciais, de acordo com os direitos pretendidos dos pacientes ou consumidores”, avalia José Santana Junior, especialista em Direito Médico e da Saúde e sócio do escritório Mariano Santana Sociedade de Advogados.


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Ainda há a possibilidade de interposição de recurso junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), se for alegado que a decisão diverge dos dispositivos constitucionais sobre essa relação de consumo.

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