Por que Brasil bate recorde de novos unicórnios em meio à crise?

Segundo especialistas, empresas de serviços de tecnologia têm se destacado nesse momento de crise global/Pixabay
Segundo especialistas, empresas de serviços de tecnologia têm se destacado nesse momento de crise global/Pixabay
País tem 20 startups avaliadas em US$ 1 bilhão e pode chegar a mais de cem nos próximos 5 anos.
Fecha de publicación: 23/08/2021

Um mercado promissor e que nem sempre é influenciado por crises políticas e econômicas. As empresas de tecnologia são, mais do que nunca, a bola da vez para investidores e grandes fundos mundiais. E o Brasil está sendo diretamente beneficiado: hoje já são 20 unicórnios, a maneira como as startups que alcançam valor de mercado acima de US$ 1 bilhão (R$ 5,38 bilhões em 22 de agosto) são chamadas. Uma história recente, que começou há apenas três anos, quando a primeira empresa, o aplicativo de transportes e táxi 99 atingiu a marca.

Logo depois, outras startups se tornaram unicórnios: PagSeguro, Stone, Arco Educação (quando abriram o capital na Bolsa de Valores de Nova York), Nubank (depois de receber investimentos de fundos da China e da Rússia), Ifood (com aporte de US$ 500 milhões dos fundos Naspers e Innova Capital, ligado a Jorge Paulo Lemann), Movile (holding proprietária do Ifood na mesma época), Loggi, Gympass e Quinto Andar (graças ao grupo japonês Softbank, que abriu um fundo avaliado em US$ 5 bilhões para investir na América Latina), Ebanx (outubro de 2019, quando recebeu um aporte do fundo de private equity FTV, do Vale do Silício), WildLife (com um aporte do fundo americano Benchmark Capital em dezembro de 2019).


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Apesar da pandemia, em 2020 foi a vez da Loft (empresa que se tornou unicórnio com apenas 16 meses de operação ao receber investimento de vários fundos estrangeiros), da Vtex (que recebeu aporte de R$ 1,25 bilhão em uma rodada de financiamento),  C6 Bank (marca atingida depois de uma capitalização de R$ 1,3 bilhão) e Creditas (recebeu uma rodada de US$ 225 milhões). Em 2021, entraram no clube  Madeira Madeira (recebeu um aporte de US$ 190 milhões), Hotmart (recebeu R$ 735 milhões na rodada de captação série C, liderada pelo fundo americano TCV, investidor da Netflix e Airbnb), Mercado Bitcoin (com um aporte do SoftBank de US$ 200 milhões) e Único (levantou em agosto de 2021 U$ 120 milhões em uma rodada Série C, liderada pelo Softbank e a General Atlantic).

"Essas companhias têm duas opções: a listagem no Brasil ou lá fora. Os unicórnios também são muito assediados para fazer abertura de capital nos Estados Unidos. A Nasdaq é vista como uma bolsa que atende esse mercado: muitos fundos, investidores com um olhar. Mas em algum momento o mercado inverteu, com um cenário econômico favorável e taxa de juros muito baixa, vivendo um frenesi com um mercado nacional superaquecido. A companhias se viam como mais uma entre centenas lá fora versus ser a empresa aqui na bolsa brasileira. Então ser a única talvez tenha um valor muito legal também", afirma Vanessa Fiusa, sócia de mercado de capitais do Mattos Filho.

O motivo dessas empresas chegarem a esse valor de mercado, segundo os especialistas, também tem relação com o investimento feito por venture capital (ou capital de risco, modalidade de investimento concentrada em startups que têm alto potencial de crescimento e também de grandes retornos).

"É um negócio disruptivo e que traz soluções que, muitas vezes, não existiam ou não eram tão demandadas, como as plataformas de videoconferência ou todas essas empresas de software que têm soluções de logística ou plataformas de mercado, de varejo. Esse cenário, como um todo, gera oportunidades. Então isso pode ser um caminho para a criação desses novos unicórnios. Tem também nos últimos anos um amadurecimento do mercado de venture capital no Brasil, com a presença muito grande de fundos de renome, estrangeiros. É tudo uma bola de neve: quando um fundo importante entra, ele certifica aquela empresa e aquele mercado para outros fundos e acaba chamando a atenção. A partir daí, o crescimento começa a acontecer numa velocidade mais acelerada", analisa Manuela Lisboa, sócia de M&A e private equity do escritório Machado Meyer

"A pandemia colocou as startups em evidência. O mundo digital trouxe soluções que antes eram usadas como algo secundário. A injeção de capital, os aportes, eles facilitam a escalabilidade do próprio negócio. Nós vemos hoje empresas consolidadas, que estão buscando soluções de startups em fase inicial de operação, que podem oferecer alternativas e serviços para o negócio consolidado", afirma Daniel Caramaschi, sócio da área de contratos comerciais, disrupt, fusões, aquisições e societário do Demarest Advogados.

A previsão da Associação Brasileira de Startups é de que o país chegue a 100 unicórnios até 2026. De acordo com analistas de mercado, alguns dos potenciais próximos unicórnios são: CargoX (logística), Conta Azul (finanças), Estapar (logística),  Guiabolso (finanças), Hurb (turismo), Neon (finanças), Nuvemshop (e-commerce), Olist (e-commerce), RecargaPay (finanças), Solinftech (agricultura), Superlógica (gestão), Take Blip (e-commerce/mídia), Taranis (agricultura), Tembici (logística) e o grupo de mídia UOL.

"Vemos um investimento muito grande em health techs, as empresas de saúde - motivado pela crise sanitária - e também as empresas relacionadas à publicidade. Muitas das que estão prestes a virar unicórnios são de logística e e-commerce. Acho que um setor que tem migrado para a questão de tecnologia é o de entretenimento e teremos outros potenciais unicórnios nesta lista. Tudo isso coloca o Brasil num patamar diferente de outros países da América Latina", explica Lisa Worcman, sócia da prática de tecnologia, inovação e negócios digitais do escritório Mattos Filho

Uma das razões para o crescimento de novos unicórnios é o aumento da necessidade por serviços digitais no ambiente de pandemia. Com isso, houve uma aceleração de transformação digital tanto entre empresas quanto clientes. Além disso, uma mudança importante nesse ambiente é o Marco Legal das Startups, que começa a valer agora em setembro e pode ajudar a criar condições mais favoráveis aos empreendedores desses modelos de negócios inovadores, facilitando o ambiente de negócios, inclusive por meio de liberação de incentivos e investimentos. A norma busca autorizar órgãos e entidades da administração pública a criar os chamados "sandboxes regulatórios" (ambiente de teste ou experimental), onde a regulação é flexibilizada para permitir o desenvolvimento de startups.

A lei incentiva a constituição desses ambientes favoráveis ao empreendedorismo inovador, com valorização jurídica da liberdade contratual para promoção de investimentos e aumento da oferta de capital a iniciativas inovadoras. E dá possibilidade de internacionalização e de atração de investimentos estrangeiros.

"O ano de 2021 tem testado os limites para estas empresas, quando passamos por este momento de captação e valuation significativo. Mas não é só sorte: tem uma quantidade de implementação, de organização e de estruturação que é muito importante para que estas empresas sobrevivam, ainda mais num país que tem uma complexidade tributária como o Brasil, para que estas empresas consigam chegar a estes níveis de captação. Tem todo um trabalho por trás disso", diz Lisa Worcman. 

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