
Nos últimos anos, o mundo começou a observar um aumento na preocupação com práticas anticorrupção, não só a nível nacional, mas também internacional. Os países passaram a criar ou adaptar suas legislações para se adequarem a essa tendência global de combate à corrupção.
Um dos precursores dessas normas foi o Foreign Corrupt Practices Act dos Estados Unidos, que tinha como fim impedir e punir práticas ilegais envolvendo governos e oficiais estrangeiros. Na mesma toada, o Reino Unido criou, em 2010, o Bribery Act, que abrange a punição de atos corruptos e de suborno.
Claro que toda essa movimentação também aconteceu na América Latina, especialmente com os grandes escândalos de corrupção, como foi a Operação Lava Jato e o Panama Papers. No México, em 2016 foi criada a Ley General del Sistema Nacional Anticorrupción e na Argentina, em 2018. No Brasil, a Lei Anticorrupção (Lei Nº 12.846) foi criada em 2013 em decorrência de pressão popular contra a impunidade percebida em alguns casos.
Leia também: Brasil denuncia retrocessos no combate à corrupção na OCDE
Para Isabel Carvalho, managing partner do Hogan Lovells em São Paulo, a lei brasileira é até mais rígida que a lei americana. “Como está na lei americana, você precisa provar a intenção e na lei brasileira, não. Você não precisa provar a intenção das partes de querer corromper ou de querer receber propina. Então, nossa lei é muito boa”, avalia.
De acordo com Isabel Franco, sócia de compliance do Azevedo Sette Advogados, o Brasil foi um dos países que mais combateu a corrupção corporativa nos últimos anos. Mesmo se comparado com países europeus ou latino-americanos, o país esteve muito à frente, justamente por conta da Lava Jato.
A advogada ainda afirma que, mesmo com o desmantelamento da Operação Lava Jato, as empresas não estão deixando de lado a preocupação com o compliance. “Elas fizeram investimento, mudaram a cultura, o mindset delas. O mercado não deixa [voltar atrás]. O mercado hoje em dia, se ele for lidar comigo, ele quer saber quem eu sou”, explica.
As mudanças na legislação impactaram positivamente o comportamento das companhias, que passaram a dar mais atenção para a área de compliance e suas práticas anticorrupção. Hoje em dia, quase todas as empresas brasileiras possuem um programa de conformidade.
Esse tipo de iniciativa passou a ser importante também para a realização de acordos de fusões e aquisições (M&A, em inglês). As operações costumam dispor de mecanismos contratuais para lidar com eventuais riscos. Para isso, é essencial que os advogados entendam o funcionamento e todos os procedimentos da empresa com a qual está fazendo o negócio.
Mas essas preocupações são recentes. Segundo Estif Aparicio, sócio do escritório panamenho Arias, Fábrega & Fábrega, “o tema anticorrupção é um dos que há dez anos não necessariamente fazia parte do checklist ou da lista de documentos a serem analisados em uma operação de M&A do ponto de vista da due diligence. Agora é”, diz.
“Isso nunca era falado no passado, antes da Lava Jato. Você tem um programa de compliance? Isso não existia. Como estão seus controles internos? Como estão suas políticas? Quantas pessoas você tem? Você tem um canal de denúncia? O canal de denúncia hoje é importante, seja para corrupção, seja para assédio”, afirma também Isabel Carvalho.
Veja também: Como lidar com as incertezas em um acordo de M&A?
Não só isso, mas há outras questões que vão além das questões anticorrupção e compliance, como as de ESG. Carvalho sugere que o tema da governança deve ser observado com especial atenção. “Se ela for fraca permite corrupção. Se apenas uma pessoa manda, ela faz o que ela quiser. Precisa ter uma governança, precisa ter um grupo que checa o outro, um relatório. Precisa ter um canal de denúncia”, afirma.
As práticas anticorrupção devem existir não só porque existem países que estabelecem padrões para as suas empresas ou por causa das normas no nível internacional e das Nações Unidas. “É importante erradicar estes comportamentos porque eles são realmente um entrave para o crescimento dos países, porque a quantidade de dinheiro que sai, como resultado dessas práticas impróprias, é enorme”, explica Estif Aparicio.
Além disso, a ausência de instrumentos de compliance desestimula, muitas vezes, o fechamento de acordos de M&A, o que também gera grandes impactos para a economia da América Latina.
Add new comment