Entre 2011 e 2015, o autor deste texto foi um dos milhões de beneficiários do Programa Universidade para Todos, o ProUni. A política pública, que foi criada em 2005, tem um sistema de funcionamento já bastante difundido pela população: com uma boa nota no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), jovens e adultos poderiam aplicar candidaturas para bolsas que poderiam cobrir todo o valor do curso. Antes ambientes voltados a quem pudesse pagar, o ProUni acabou sendo uma porta de entrada para a Universidade e, mesmo em tempos de crise como em 2021, ofereceu cerca de 160 mil bolsas ao ensino superior.
Seu sistema de funcionamento, no entanto, está em risco com a reforma tributária. Especialistas e representantes de classe do setor argumentam que a extinção de contribuições e impostos pode acabar com a base legal para a concessão de bolsas. O tema preocupa as empresas do setor - e também um crescente número de parlamentares no Congresso Nacional.
Na Lei de 2005 que regulamenta o ProUni, o governo estipula as regras para que as universidades participantes do programa: no primeiro ano do programa, uma bolsa integral deveria ser concedida para cada nove estudantes regularmente pagantes, ou então uma bolsa integral a cada 19 pagantes, desde que bolsas de 25% e 50% também fossem disponibilizadas. Hoje, a média seria a de uma bolsa concedida a 10,7 alunos matriculados.
O resultado foi uma política pública de sucesso: o ProUni já atendeu quase 3 milhões de estudantes desde então, sendo 70% desses com bolsa integral e 30% com bolsa parcial. Destes, 42% são brancos, e a maioria, 58%, de pretos, pardos e indígenas. As empresas se viram isentas de IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica), CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), PIS e Cofins.
Com a reforma tributária, algumas dessas contribuições devem ser extintas. O relator da PEC 110 no Senado Federal, Roberto Rocha (PSDB-MA), já acenou que pretende unir PIS e Cofins, assim como ICMS e ISS, em uma reforma voltada ao consumo; o texto sobre a reforma do imposto de renda (PL 2.337/2021) também já chegou ao Senado após aprovação na Câmara; e a PEC 45 ainda aguarda na Câmara e tem também como proposta a unificação de impostos. Todos eles têm algum tipo de apoio de setores da indústria e serviços.
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“Toda proposta que altera IRPJ, PIS, Cofins e CSLL afeta, de alguma forma, o ProUni”, diz a LexLatin Juliano Griebeler, que representa o movimento Não à Custa da Educação. Ele exemplifica com o quinto projeto em tramitação no Congresso sobre a reforma tributária: “O projeto de Lei do governo de unificar o PIS e a Cofins, criando a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) tira o PIS e Cofins do ProUni e não coloca a CBS no lugar”.
Para o setor, uma aprovação neste sentido pode ser catastrófica. “O PIS e Cofins, que representam 40% do programa, são retirados”, explicou. “E, ao se fazer isso, o programa acaba.”
Juliano entende que cada proposta em discussão atacaria o programa de maneira diferente. “A PEC 110 apresentavam ameaças que a PEC 45 não apresentava ao ProUni”, ponderou. “O ProUni é um programa que funciona, e faz sentido do plano orçamentário, de inclusão social, de qualidade e de política pública. Na situação do Brasil, é difícil não continuar com um programa desses.”
A proposta desta PEC joga uma luz de insegurança sobre o setor, que pode trazer outros efeitos além do menor número de bolsas.
“O ProUni funciona exatamente como uma desoneração de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins sobre as universidades participantes. A substituição do PIS e Cofins pela CBS, como está sendo proposto, deverá ser acompanhado de uma alteração na legislação que estabelece esse benefício fiscal”, ressalta o sócio do Daniel e Diniz Advocacia, Carlos Daniel, “pois essa substituição não pode ocorrer de forma automática, por se tratar de tributos distintos.”
Em relação ao IRPJ e CSLL, uma eventual redução das alíquotas cobradas, com a reforma, pode reduzir o tamanho da renúncia fiscal, alerta o tributarista. O efeito seria uma menor desoneração a estas faculdades.
“Portanto, sem as adaptações legislativas necessárias, a eliminação do PIS/Cofins e a redução das alíquotas de IRPJ/CSLL podem gerar um desinteresse das universidades em aderir ao programa”, aponta.
“Ao tempo em que a PEC 110 não impede que essas definições, seja na lei da CBS, seja na lei complementar do IBS, tragam o tratamento diferenciado para o setor de educação, ela também não garante esse tratamento”, apontou Emerson Casali, do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular.
“E aí ela traz uma tremenda insegurança para o setor, ou seja, diante disso aqui, a gente tem uma situação em que a gente pode ter aumentos de mensalidade muito significativo”, continuou Casali. “É muito significativo. Os maiores aumentos estão na educação.”
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O tema chegou ao ouvido dos senadores na semana passada. Na quarta-feira (11), a Comissão de Educação ouviu representantes do setor - e mesmo parlamentares se mostraram solidários à causa. “O ProUni, o Fies e o Pronatec são instrumentos que podem ajudar a fazer com que o aluno competente possa ter acesso à educação independentemente de cotas e de outros mecanismos”, disse a senadora Maria Eliza, do MDB de Rondônia. “É um programa social que, mesmo que não tivesse retorno financeiro, teria um retorno social muito grande.”
Juliano diz que a conversa com parlamentares têm surtido efeito para alertar sobre o problema. A julgar por estas manifestações, a expectativa é que o texto seja alterado para que o programa seja mesmo mantido. “Eles têm se mostrado muito preocupados com o que pode acontecer com o ProUni. E todos eles têm defendido que o intuito não é acabar com o programa, e sim mantê-lo”, contou. “O caminho é conversar para buscar alternativas que não trazem impacto ao programa, propondo emendas às propostas que entrarão em discussão.”
“O ProUni funciona exatamente como uma desoneração de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins sobre as universidades participantes. A substituição do PIS e COFINS pela CBS, como está sendo proposto, deverá ser acompanhado de uma alteração na legislação que estabelece esse benefício fiscal”, ressalta o sócio do Daniel e Diniz Advocacia, Carlos Daniel, “pois essa substituição não pode ocorrer de forma automática, por se tratar de tributos distintos.”
Em relação ao IRPJ e CSLL, uma eventual redução das alíquotas cobradas, com a reforma, pode reduzir o tamanho da renúncia fiscal, alerta o tributarista. O efeito seria uma menor desoneração a estas faculdades.
“Portanto, sem as adaptações legislativas necessárias, a eliminação do PIS/Cofins e a redução das alíquotas de IRPJ/CSLL podem gerar um desinteresse das universidades em aderir ao programa”, aponta.
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