Renúncia de presidente da Eletrobras aponta incerteza em privatizações

A dificuldade em desestatizar a empresa causou o desgaste que levou à renúncia/Tomaz Silva/Agência Brasil
A dificuldade em desestatizar a empresa causou o desgaste que levou à renúncia/Tomaz Silva/Agência Brasil
Incapacidade de levar proposta à frente frustra dois ministérios ao mesmo tempo 
Fecha de publicación: 26/01/2021

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A semana começou com uma surpresa no setor elétrico: após quase cinco anos no comando da Eletrobras, Wilson Ferreira Júnior anunciou sua renúncia do comando da maior estatal do setor elétrico brasileiro. A carta de renúncia foi entregue no domingo (24) à noite, seguida de um breve comunicado ao mercado – já que a empresa é de capital misto, com controle majoritário pelo governo.

Na segunda-feira (25), em call com investidores, Wilson confirmou as razões que forçaram a sua saída do comando da estatal: a partir de março, o dirigente passa a comandar a BR Distribuidora, braço de distribuição de combustíveis da Petrobras. O motivo da sua saída do comando da Eletrobras foi mesmo a incapacidade de avanços significativos no processo de privatização da companhia, que vem desde o início de seu mandato já nos primeiros meses de governo de Michel Temer.

“Não conseguimos ver a tração que esse processo deveria ter". disse, durante a teleconferência. "É uma percepção pessoal. E em cima dela foi que eu tomei essa decisão anunciada ontem". A empresa aproveitou para revelar, em outro comunicado ao mercado, que contratará um headhunter para buscar o novo nome e que Wilson permanecerá como parte do conselho de administração. 

Enquanto o processo de privatização não caminhava, Wilson conseguiu avanços em outras frentes com a companhia: a empresa concluiu a colaboração com investigadores da Lava Jato nos Estados Unidos sobre escândalos de corrupção ocorridos em seu interior – o que permitiu que a empresa voltasse a ter as ações negociadas pela NYSE (New York Stock Exchange), a principal bolsa de valores americana. A empresa também conseguiu privatizar algumas de suas últimas distribuidoras nas regiões Norte e Nordeste, bastante deficitárias, o que ajudou a melhorar seus indicadores.

Mas é a dificuldade em desestatizar a empresa que causou o desgaste que levou à renúncia. A proposta era encampada não apenas pelo ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, como também pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. O primeiro disse confiar, em diversas oportunidades entre 2020 e tão recente quanto a semana passada, que a privatização da empresa ocorreria em 2021. O segundo tem como proposta de Estado a cessão à iniciativa privada de ativos de controle da União. 


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Há no entanto uma resistência forte à proposta dentro do Congresso Nacional, onde o projeto de diluição de ações tem de ser aprovado. O PL 5877, apresentado em 2019 pelo governo federal, jamais avançou dentro da Câmara dos Deputados. No Senado Federal, um dos candidatos favoritos à eleição para presidente da casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já disse que há reformas em suas prioridades – mas entre elas, não estariam a estatal.

Na visão de especialistas do setor elétrico, a saída de Wilson e a resistência de atores políticos à privatização enviou um sinal de preocupação ao mercado. "Há players que vinham apostando nesta perspectiva", ponderou o presidente da comissão de Energia do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Gustavo de Marchi . "Mas a resposta do mercado é natural". Na segunda-feira, dia seguinte ao anúncio, as ações da Eletrobras chegaram a cair 10%.

"[A privatização] não saiu não por uma questão setorial, mas sim por uma questão política", disse Urias Martiniano Garcia Neto, que é sócio do Tomanik Martiniano Sociedade de Advogados. O advogado, especialista em regulação do setor elétrico, teme que o insucesso da operação reflita não apenas no setor elétrico, mas na economia como um todo.  

Ambos os advogados acreditam que a saída de Wilson põe em xeque a operação de desestatização – mas que o fato não é um xeque-mate. "Não posso acreditar que a privatização dependa de um nome e de uma pessoa", argumentou De Marchi. "A questão é definir a prioridade, em qual a velocidade e a conformidade para esta privatização". O advogado defende que não se pode desconsiderar o caráter estratégico, setorialmente falando, de uma empresa do tamanho da Eletrobras.

Urias afirma que uma das principais necessidades da Eletrobras é ter seus ativos estratégicos imunes a um viés político. "A melhor forma que temos hoje é a privatização", comentou. "Se a privatização de fato não ocorrer tenho que pensar em outras estruturas para tirar este ativo [do viés político]. Ainda que se trate de uma empresa pública, os cargos nesta companhia têm um viés corporativo. É preciso virar a chave", concluiu.


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