STF adia decisão sobre regras em cessão de campos de petróleo a Petrobras

Carlos Moura/STF
Carlos Moura/STF
Dias Toffoli fez pedido de vistas e placar está em 4 x 4; julgamento não tem previsão para ser retomado
Fecha de publicación: 19/02/2020
Etiquetas: Brasil

A União pode ou não pode ceder jazidas de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos sem a licitação dos moldes formais da Lei nº 8.666, que rege as licitações da administração pública federal? Após oito votos, ainda não há consenso no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre esta questão: nesta quarta-feira (19), o caso foi suspenso para a vista.

O debate ocorre durante a análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.942. A ADI foi impetrada na suprema corte pelo Partido dos Trabalhadores (PT), contra o Decreto nº 9.355. Assinado em 26 de abril de 2018 pelo então presidente Michel Temer, o texto determina novas regras da cessão dos direitos de exploração dos campos de petróleo e gás natural, flexibilizando as regras de licitação no setor. 

Como apenas a União poderia efetuar a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos, foi aberta uma permissão para que a União cedesse a exploração de bacias do pré-sal para a Petrobras, chamada de "Cessão Onerosa".

Segundo o PT, a tentativa do poder Executivo de regular a cessão por meio de decreto usurpou a função do Congresso Nacional - já que o tema deveria ser regulamentado por meio de lei aprovada na Câmara e no Senado, e não pelo dispositivo presidencial. "Tal anomia anticonstitucional vai muito além de mera ilegalidade do decreto em face da lei ou de inconstitucionalidade reflexa: trata-se de ofensa mortal ao princípio da separação dos poderes", explicou o partido na petição inicial enviada ao Supremo.

O argumento foi acatado pelo ministro relator do caso, Marco Aurélio Mello, que suspendeu os efeitos do decreto no final de 2018, até que o plenário da Corte decidisse sobre a questão. "O robustecimento dos mecanismos de atuação da Petrobras em ambiente de competição com os demais agentes econômicos, essencial à higidez financeira da sociedade, não pode conduzir ao afastamento do previsto na Constituição Federal, sob pena de abrir-se a porta para todo tipo de fraude, ao arrepio dos princípios constitucionais da Administração Pública", pontuou o relator. O decreto está desde então sem efeitos, aguardando a manifestação do plenário da corte. 

Durante a sessão da manhã, os ministros ouviram as sustentações orais das partes no processo. Ao todo, quatro patronos se revezaram na tribuna do plenário.

Representando o Partido dos Trabalhadores, que apresentou a ação, o advogado Bruno José Silvestre de Barros defendeu que a venda de ativos como campos de petróleo deve ser feita conforme a lei e os devidos procedimentos, não podendo ser feitos de maneira transversa. "A escandalosa finalidade daquele decreto é impedir a vigência de lei federal" apontou Silvestre de Barros, que ainda advertiu: "a porta que se abre para a corrupção com este decreto é absurda".

A Presidência da República foi representada pelo Advogado-Geral da União, André Mendonça. Para ele, o parâmetro para a questão não é a lei das estatais, que é a lei geral apontada pelo PT, mas sim a Lei do Petróleo, que é específica, e os termos legais do pré-sal. Com isso, o decreto visa explicar a lei e facilitar sua execução. "Há expresso fundamento legal para a edição de decreto que regulamenta a forma como vai haver ou há este tipo de cessão ou transferência contratual", apontou em sua sustentação.

Houve ainda duas sustentações orais em nome de interessados no caso. Pelo Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP), se apresentou a advogada Maricí Giannico; pela própria Petrobras, falou Tales David Macedo, para quem o decreto dá segurança jurídica às operações da companhia, impondo a ela práticas de governança corporativa

O caso retornou no período da tarde. Primeiro a votar, o relator, ministro Marco Aurélio, julgou procedente a ADI, considerando o decreto inconstitucional. "Julgo procedente porque, a rigor, se afastou a lei federal de licitações mediante o decreto", afirmou o relator, ao resumir seu voto.

A primeira divergência veio do ministro Alexandre de Moraes. "A excepcionalidade da regra restrita de licitação está prevista e tem embasamento legal no artigo 173 da Constituição", apontou o magistrado. Segundo Moraes, se entendeu por bem regulamentar o procedimento para gerar maior competitividade e impessoalidade nas contratações. "O que fez o decreto foi regulamentar e garantir segurança jurídica a algo que ocorreu de 1997 a 2018. A partir de 2018 [houve] uma regulamentação mais restritiva para garantir a competitividade, transparência e impessoalidade, sem afastá-la da competitividade do mundo privado". 

O raciocínio divergente foi seguido pelo ministro Luís Roberto Barroso: "A Constituição permitiu, expressamente, que a lei ressalva a realização de licitação. O que é preciso verificar é se a lei que ressalvou neste caso é se esta lei [no caso, as Leis nº 9.478 e n 12.351] são constitucionais", concluiu.

O placar está em quatro votos a quatro. Acompanharam o relator os ministros Luis Edson Fachin, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski. Além de Barroso e Moraes, Luiz Fux e Gilmar Mendes. Nono a votar, o presidente da corte, Dias Toffoli, pediu vista, uma vez que o caso não poderia ser concluído sem o voto dos dois ministros ausentes à sessão, Cármen Lúcia e Celso de Mello. O julgamento deverá ser concluído quando ambos retornarem. 

Para declarar uma lei ou decreto inconstitucional, são necessários seis ministros - o que não foi possível no julgamento desta quarta-feira. A expectativa é que o caso volte a ser analisado após o retorno às atividades em março do ministro Celso de Mello e da ministra Carmen Lúcia, que estão de licença médica.  

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