Adriana Ospina: "O sucesso é ajudar os vulneráveis"

Adriana Ospina: "El éxito es ayudar a los vulnerables"
Adriana Ospina: "El éxito es ayudar a los vulnerables"
Fecha de publicación: 22/09/2017
Etiquetas: rompiendo moldes

Entrevistamos Adriana Ospina quem muito recentemente – em 31 de agosto deste ano – saiu de seu cargo como Diretora do capítulo Women in the Profession do Vance Center de Nova Iorque para iniciar-se num projeto independente. Fá-lo-á como advogada no campo da educação especial nos EE.UU. Nosso afortunado encontro forma parte da série de entrevistas Rompendo moldes. Como já indicamos, nesta série conversamos com as advogadas mais influentes da região.

Adriana Ospina tem andado um caminho que lhe permite entender as experiências de muitas das advogadas às que já temos entrevistado. Sua carreira é já muito extensa e tem exercido o Direito por aqueles caminhos que lhe permitiram fazer de seus sucessos profissionais um trabalho social. Sua passagem pelo Vance Center tem sido chave para fortalecer o movimento de integração de mulheres advogadas na América Latina e para atender as necessidades da sociedade civil através da justiça.

— Qual é sua carta de apresentação como advogada?

— Tenho tido uma carreira um pouco diferente à de outras advogadas com as que você tem falado em Rompendo moldes. Formei-me em Harvard e trabalhei dois anos em Nova Iorque como Associada em Shearman Sterling LLP. Depois fui morar no Brasil, até 1993, para finalmente passar também dois anos na Colômbia como of counsel para a firma.

Por aquela época Shearman Sterling LLP não tinha escritório no Brasil e na Colômbia nunca o tem tido. Tínhamos algo bem como um acordo de meio tempo, mas era um pouco complicado, porque eu podia rejeitar trabalhar numa transação, mas no momento em que me comprometia, já não tinha controle de meu tempo. Mais ou menos funcionava, mas quando tive meu quarto filho, desisti.

Não voltei a trabalhar como advogada até o 2015. Estive muitíssimos anos fazendo outras coisas, entre elas política em Greenwich, no Estado de Connecticut (EE.UU.). Depois foi quando comecei a trabalhar no Vance Center, em abril de 2015.

— Quando a senhora olha para atrás e faz uma avaliação do que tem andado até agora em sua carreira, quais experiências e quais pessoas têm tido maior impacto no pessoal e no trabalhista?

— No trabalhista eu diria que Jeanne Olivier. Ela era Associada Sênior quando comecei a trabalhar com ela em Shearman Sterling LLP. Colocaram-me numa transação com ela e foi minha mentora. Foi quem me recomendou a uns sócios no Brasil e voltei a trabalhar para ela desde a Colômbia.

Sempre mantive contato com ela, e faz três anos, quando decidi retirar-me da política, me reenfoquei no quê queria fazer com minha carreira. Tinha muito claro que não queria voltar a ser advogada corporativa e que queria trabalhar em algo que eu sentisse que tivesse um aspecto social. Encontramo-nos e me sugeriu entrar no Vance Center.

Eu tenho uma garota especial e tinha trabalhado no campo do Direito numa organização de educação especial de Greenwich. Tinham conseguido uma subvenção para material, mas não era suficiente para contratar professores, pelo que me pediram que dessas aulas. Trabalhei gratuitamente, ensinando o direito de educação especial a pais hispanos de baixos recursos. Assim também comecei meu trabalho na política. Por isso foi que quando falei com Jeanne lhe disse que queria fazer algo: trabalhar com imigrantes, educação especial ou algo de gênero. Isso foi o que me levou ao Vance Center.

—De não ter trabalhado no mundo jurídico ao mesmo tempo que no Terceiro Setor, quê outra profissão acha que teria desempenhado com sucesso e paixão?

— Meu sonho sempre foi ser doutora e de fato muitas vezes me pergunto se deveria ser voluntária na Cruz Vermelha. Contudo, meus pais não me deixaram estudar Medicina. Vivíamos na Colômbia na época em que os médicos acudiam também à casa. Meu pai e minha mãe eram da teoria que uma mulher não devia ser médica porque senão não ia se casar e ter filhos. Escolhi o Direito que é uma carreira que tenho desfrutado muito, mas lhe confesso que foi minha segunda eleição.

— ¿Quê diferença se via entre ser advogada e ser médica? Ser advogada também consume muito tempo…

— Sim, mas vai a um escritório e por então a imagem do advogado corporativo na Colômbia – porque em Nova Iorque me tocou trabalhar fins de semana e chegar à casa às 9 da noite – era a do que ia ao escritório de 8:30 às 17 horas.

Certamente não trabalhavam finais-de-semana. Naquela época não tinha Internet, ninguém podia localizar-te e não passava pela cabeça das pessoas chamar-nos em casa.

— Quê é o mais satisfatório e o mais frustrante de trabalhar em projetos de igualdade de gênero?

— O mais satisfatório é o programa que eu armei. O programa Women in the Profession (WiP) do Vance Center era um programa que levava uns sete anos. Tratava-se duma conferência anual, onde um grupo de advogadas latino-americanas se juntavam e discutiam problemas, como o fato de que a pesar de que nas faculdades o número de advogados e advogadas era metade e metade, o número de sócias era muito baixo - algo que por certo não tem progredido nos últimos 15 anos.

Logrei formar um programa em dois anos com 19 capítulos em 18 países. Uma das coisas que exigi – me contrataram para projetos pro bono, não para o programa WiP – foi que me permitissem obrigar estes grupos fazerem um trabalho social. A situação das profissionais latino-americanas não é fácil, mas já são advogadas. Em minha cabeça essas mulheres já são privilegiadas, enquanto que há mulheres com muitas mais necessidades. Deram-me o sim e logrei que todos estes grupos firmassem um compromisso para fazer um projeto caritativo pro bono ao ano.

Estes projetos não tinham que ser obrigatoriamente um serviço legal. Para dar-lhe um exemplo, no Uruguai, há um projeto de treinamento para garotas da secundária em bairros pobres. O referido projeto busca incentivá-las a que estudem uma carreira. O Paraguai também faz um programa para mulheres vítimas de violência de gênero chamado “Conheça seus direitos”. Ensinam às mulheres quais são seus direitos quanto à proteção contra a violência, mas também quanto à educação e saúde de seus filhos. Sinto que esse foi o grande triunfo, ter criado o programa em dois anos.

Eu não sei se estamos avançando, é uma situação muito difícil. Ninguém entende por quê com todo o esforço, dinheiro e tempo que tem sido dedicado a estes problemas nos últimos 40 anos, a situação não melhora. Contudo, eu sinto que aquelas coisas que a gente não fala nem mede, não mudam. Sim que percebo que há coisas de nosso programa que, oxalá, ajudem a cambiar nas posições de liderança para a mulher, e que ao mesmo tempo, estamos ajudando às mulheres em situações mais vulneráveis. Esse para mim é o sucesso.

A frustração é que para o grupo com o que eu trabalho isto é sua obra caritativa. É o que fazem quando têm tempo livre. A vantagem quando trabalhas com as ONGs – e não diretamente com a gente – é que estás ajudando duma forma sistêmica. A desvantagem é que não trabalhas com a gente diretamente, é mais difícil medir o impacto que tem.

— Claro, há coisas que não se medem nem se põem sobre a mesa, a pesar de que se sofram as consequências de um problema. Neste sentido, Quê impactos qualitativos e quantitativos têm tido as iniciativas pro bono nas firmas latino-americanas?

— Eu acho que muito. A nível qualitativo hoje existem a mentalidade e a política pro bono. Faz 20 anos ninguém falava disto. Quando comecei a trabalhar nos deram uma subvenção para estabelecer a iniciativa pro bono na América Central. Fui à Guatemala para reunir-me com organizações e firmas de advogados. Três organizações me disseram “senhora, dê meia volta e vá embora porque aqui os advogados guatemaltecos são gente rica. Desconfiam de nós, acham que todas as pessoas que trabalham em ONGs são comunistas”. Logo tive minha reunião com os advogados e que grata surpresa! Muitos não sabiam o que era o trabalho pro bono, mas estavam superinteressados. Um ano depois tínhamos inaugurado o começo da Fundação Pro Bono Guatemala, que é a fundação que estão financiando 12 firmas guatemaltecas para fazer este trabalho sistematizado. Esse é o impacto que tem tido o Vance Center.

A nível quantitativo sempre existe a controvérsia de que o trabalho pro bono se mede por hora. Há quem pensa que não é suficiente e que há que medir se algo está cambiando. Eu não estou tão de acordo, porque para mim cada pessoa que a gente ajuda é uma pessoa menos que está sofrendo as consequências de não aceder à justiça. Não é a forma perfeita de medir, mas é muito.

— Neste sentido, como o estatus social das pessoas e as sociedades representam o acesso aos serviços jurídicos?

— Isso é assim em todos os países, tristemente quem tem dinheiro é o quem tem acesso à justiça. Vê-se nos EE.UU a quantidade de gente negra que está no cárcere e é porque não têm acesso a advogados. Faz pouco houve um caso de um estudante de Stanford que violou uma jovem e o juiz lhe deu somente uns meses de prisão porque os pais milionários contrataram os melhores advogados. Eu não me faço ilusões de que o dinheiro não é o que lhe dá acesso à justiça, mas é o que tentamos mudar com o trabalho pro bono, embora é uma gotinha d'água no meio do mar.

— ¿Quê metas das que perseguia tem logrado com sucesso em seus dois anos no Vance Center e quais considera que deixa em mãos de quem receber o testemunho? Seria interessante saber também quem vai lhe relevar no cargo, se o pode fazer público…

— Sinto que já fiz o mais difícil, que foi criar o programa. Mantê-lo pode ser um pouco complicado. Ao princípio todo o mundo está ilusionado, mas tenha em conta que falamos de 18 países, dos quais em 15 antes não tinha nada. Estas pessoas são advogadas às que eu convenci de juntar-se e criar um grupo de Women in the Profession. Dos 18 países, uns 14 estão funcionando relativamente bem e com os outros quatro me tem tocado estar muito pendente. Minha ilusão é que quem vier depois, logre manter tudo isto e se esforce muito.

Com respeito a quem vai me relevar, eu levava três programas e o Vance Center decidiu contratar três pessoas distintas. Ainda estamos no processo de seleção.

— Antes de trabalhar no Vance Center, a senhora serviu como membro do Conselho de Educação de Greenwich em Connecticut e foi uma forte defensora de iniciativas para reduzir a brecha de logro entre estudantes de minorias e seus homólogos não-minoritários em escolas públicas. É esta experiência a “culpável” de que agora deixe o Vance Center para trabalhar num projeto de educação?

—Totalmente. As decisões que a gente toma na vida às vezes são muito aleatórias. Sempre tenho me mantido em contato com o mundo da educação especial. Deu a casualidade de que uma família me pediu ajuda para sua filha. Contratar um advogado para estes processos tem um custo de USD 5.000. Esta família podia pagar algo como a metade. Eu lhes ajudei a conseguir os serviços no distrito porque o conheço, e conheço a lei. Logrei ganhar o pleito. Então, lembro de pensar “mudei a vida a uma menina de 9 anos”. Fiquei pensando se isto não é muito mais satisfatório. Embora seja só uma menina, eu a conheço e conheço seus pais.

Encontrei-me com uma amiga que trabalha como Special Education Advocate e a quem eu levava tempo sem ver. Perguntou-me por quê não me dedico a isto. Insistiu e me disse que lhe avisasse quando tivesse tempo porque tem muitos clientes que falam espanhol e português, aos que ela não pode atender. Disse-me que abrisse meu escritório e que imediatamente me bombardearia com clientes.

Decidi que queria estar mais perto das crianças. Quero ajudar as famílias que têm crianças com necessidades especiais para que suas vidas não sejam tão duras e tenham uma oportunidade de aceder aos direitos que a lei lhes dá. Simplesmente por ser estudantes em Greenwich, a Lei de Educação Especial (IDEA) disse que enquanto a gente viver numa cidade e ir à escola pública dessa cidade, a gente tem direito a todas estas proteções, independentemente de que sejas legal ou ilegal. Assim foi que tomei a decisão. Foi uma decisão rápida, um dia me levantei e me disse que isto é o que realmente quero fazer.

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