Ao falar de destruição criadora, Schumpeter aborda o processo de inovação que, ao criar produtos e serviços, destroem os ultrapassados modelos de negócios. Keynes replica a lei de Jean-Baptiste Say ao mencionar que a “oferta cria sua própria demanda”.
Assim têm sido a digitalização da economia ao mudar a antiga logística de produção e distribuição, que operava como uma ferrovia, para o que hoje se poderia descrever como multicanal ou omnicanal.
Tal ambiente disruptivo permite ao consumidor adquirir, remotamente, vários produtos e serviços de origem nacional ou internacional por meio de aplicativos conectados à rede mundial.
O IVA – Imposto Sobre Valor Agregado - e sua sistemática antiquada e ultrapassada é incapaz de lidar com a economia digital, visto que ele não é um imposto sobre consumo em stricto sensu, mas sobre a produção e comercialização que traslada sua carga tributária, com todas as distorções e ineficiências até o ato de consumo.
O tributo causa várias externalidades negativas como excesso de obrigações intermediárias, concessões de benefícios à revelia, tributação na origem, acumulação de créditos financeiros não devolvidos pelo fisco, aumento do custo dos produtos exportados, enorme quantidade de alíquotas, legislação distinta entre os entes federados, guerra fiscal, a ofender os princípios da certeza e simplicidade.
Basta observar o elevado custo de conformidade fiscal transferido aos preços fruto da necessidade das quase 2.000 horas anuais, a contrariar o princípio da eficiência.
Outro dano causado aos preços é o peso morto tributário, que provoca ineficiência nas trocas comerciais e deturpa a alocação de preços e recursos. Tal fato ocorre em virtude da translação da carga tributária ao adquirente e sua impossibilidade repassá-la, visto a atuação das elasticidades-preço da oferta e demanda derivadas da vantagem competitiva dos atores, a desobedecer o princípios da neutralidade.
O IVA é incapaz de se adaptar à digitalização da economia por lhe faltar o princípio da flexibilidade; e além, não atinge as operações C2C e se complica, demasiadamente, com o excesso de burocracia nas operações B2C.
A pá de cal fora a instituição da substituição tributária (ST) com antecipação de fato gerador e base de cálculo do imposto determinada por média ponderada; tal característica provoca uma das deformidades no já combalido tributo, a contribuir para sua entropia.
Alguns Estados estão a promover a “complementação” da ST no ICMS, ou seja, se o valor da venda a consumidor for maior que a base de cálculo ST, deverá o substituído recolher a diferença; de modo que a sistemática do IVA já não é mais utilizada, porque não há mais translação do imposto em cada etapa negocial a gerar mais distorções e obrigações acessórias.
Sem mencionar que há propostas de reforma tributária a combinar o IVA com imposto sobre transações financeiras, o que pode gerar uma quimera de 2 cabeças. Concedamos então ao IVA o merecido “descanse em paz” pelos serviços prestados.
Em contrapartida, propomos um imposto sobre o consumo (stricto sensu) de bens e serviços, cujo fato jurídico tributário será a aquisição pelo consumidor. Sua característica será monofásica e com ônus tributário sobre o valor da mercadoria e não sobre seu peso, quantidade ou volume, além de tributação no destino em consonância com pilar 1 de OCDE, alíquota entre 9 a 12%, competência estadual partilhada com o município, visto que abraçará o ISS, com potencial arrecadatório consideravelmente maior que a somatória do ICMS e ISS.
Neste cenário, a ter o consumidor como contribuinte de fato e direito, o legislador elegerá o responsável para o pagamento do crédito tributário que poderá ser o vendedor, o intermediário financeiro ou o intermediário comercial, pois estarão sob este guarda-chuva todas as operações B2C e C2C.
Neste sistema não haverá tributação sobre a produção e comercialização, pois a carga tributária incidirá uma única vez e será suportada pelo consumidor no momento da compra, que conhecerá o valor do tributo pago, a obedecer ao princípio da transparência fiscal.
O custo resultante das ineficiências geradas pelo combalido IVA não mais será transferido ao preço dos bens e serviços, a provocar uma redução dos preços e facilitar a concorrência entre os comerciantes.
Poderemos nominá-lo de “Imposto sobre Consumo de Bens e Serviços”.
A transição para a este novo imposto em substituição ao IVA é tranquila e rápida. Poderá conviver, temporariamente, com o desfigurado IVA, vez que há estados e municípios dependentes da arrecadação do ICMS na origem. Ademais, eles poderão contar com a competência para estabelecimento de imposto seletivo monofásico a tributar determinados bens ou serviços.
Tal sistemática promoverá uma sólida evolução no sistema tributário brasileiro, especialmente na tributação sobre consumo. E encerrará as eternas discussões sobre crédito financeiro ou físico, origem e destino, se incidiria ICMS ou ISS e, o mais importante, concederá maior autonomia financeira aos entes subnacionais além de trazer estabilidade, simplicidade, clareza, eficiência neutralidade e transparência à tributação indireta.
*Urbano Montero Martínez é graduado em economia com especialização pela George Washington University.
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