Decepção com a criação de empregos nos EUA em abril?

Em abril os EUA criaram 266 mil empregos, o que não foi suficiente para reduzir a taxa de desemprego/Pixabay
Em abril os EUA criaram 266 mil empregos, o que não foi suficiente para reduzir a taxa de desemprego/Pixabay
Juros e emissão monetária farão com que moedas de mercados emergentes valorizem.
Fecha de publicación: 10/05/2021

Decepção. Primeiro sentimento que muitos analistas tiveram quando receberam os dados de criação de empregos nos EUA de abril. Enquanto os agentes econômicos esperavam uma criação da ordem de 1 milhão de novos empregos, seguindo o mantra “para o alto e avante”, o dado veio bem abaixo das expectativas. Em abril os EUA lograram criar 266 mil empregos levando a taxa de desemprego de 6% para 6.1% em comparação com o mês anterior. Em março, os EUA chegaram a criar 770 mil novos empregos, então como esse dado veio tão abaixo das expectativas e quais os impactos nos principais índices e preço de ativos com esse indicador “sombre”?

Lembrando o sentimento expresso no primeiro parágrafo desse artigo, talvez a decepção não tenha sido para todos. Não porque o número de empregos criados tenha vindo menor do que o esperado. Longe disso. Quanto mais trabalhadores empregados, melhor. Mas mesmo assim, quais têm sido os impactos desse importante dado econômico anunciado na última sexta-feira (7)?


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Primeiro que o fato de os EUA ainda estarem em uma ascendente em termos de pujança econômica, não se trata de uma corrida de 100 metros, mas de uma maratona, como argumentou o presidente do país, Joe Biden. Além disso, esse indicador acaba corroborando o discurso do chairman do FED Jerome Powell, de que as taxas de juros continuarão ainda por um bom tempo entre 0% e 0.25% e “ainda não é hora de termos essa conversa de tapering” ou fim das emissões de US$120 bilhões mensais.

Pelo menos, não por enquanto. Eis que um dado mais fraco de emprego acaba corroborando o que Powell falou, ou seja, a recuperação da economia dos EUA ainda é desigual e não plena. Estímulos continuam sendo necessários. Juros e emissão monetária continuarão como estão, o que acaba afetando positivamente as bolsas de valores e pressionando para que moedas de mercados emergentes continuem apreciando, como é o caso do Real brasileiro.

O Banco Central dos EUA continuará com seu expansionismo monetário, agora com um indicador importante para sua decisão. Biden por sua vez, com um plano de US$1.9 trilhões de ajuda social com o governo dando cheques de US$ 1.400 para a maioria dos norte-americanos e US$ 300 semanais até setembro para os desempregados, tem se mostrado, de certa maneira, ainda insuficiente para estimular o mercado de trabalho via maior consumo, o que acaba conferindo uma retórica mais forte para a aprovação do pacote de US$ 2,26 trilhões para infraestrutura.

Do outro lado do Congresso, os Republicanos justamente utilizam o mesmo argumento, mas com sinal contrário para explicar a “decepção” com a criação de empregos em abril. Com tais benefícios, o interesse de sair à procura de empregos, quando o governo deixa em sua porta um cheque de US$ 1.400 e mais US$ 300 semanais diminui, daí a ineficiência do pacote expansionista.

Talvez. Faltam dados robustos para tal afirmação, mas de bate pronto se essa fosse a razão primordial pela menor criação de empregos, então os estados que tiveram maior criação de empregos deveriam ter os salários mais baixos, mas não foi isso que ocorreu.


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Segundo que estimar a criação de novos empregos em um cenário atípico de pandemia, vacinação e início de abertura econômica não é fácil. Variáveis como ritmo de vacinação, lockdowns e aberturas de escolas irregulares, pessoas vacinadas que tomaram a primeira e a segunda dose, confiança em outros mercados consumidores, receio da população em relação à imunização, são variáveis novas não totalmente mapeadas e conhecidas.

O cenário econômico está atípico. Além disso, a pesquisa que estimou a criação de empregos em abril foi realizada na semana do dia 12 de abril. No mês anterior, a administração atual administrou 200 milhões de doses de vacinas contra a Covid-19 e 100 milhões de norte-americanos já podem ser considerados imunizados. Ou seja, o descompasso da estimativa de criação de emprego com o ritmo da vacinação pode ter levado alguns trabalhadores não imunizados na semana em questão a já estarem empregados atualmente. Talvez o ritmo de contratação não tenha sido tão rápido quanto esperado, puramente por um problema sanitário.

Por fim, há de se considerar que nem todas as escolas do país já foram totalmente abertas para o ensino presencial, o que pode cercear o desejo pela procura de um emprego full-time, para pais que ainda precisam ficar em casa com seus filhos e não tem recursos para deixá-los aos cuidados de terceiros.

Tudo isso nos leva a crer que, apesar de à primeira vista o indicador de criação de empregos não ter sido como o imaginado, no curto prazo ainda pode suscitar ganhos em alguns ativos e apreciação de moedas de países emergentes. Por outro, parece um pouco cedo, dada as características dessa combinação perversa de choque de demanda e oferta que a pandemia ocasionou, termos todas as variáveis sob controle para dizer com confiança o que deve acontecer com as economias nesse momento de transição para a abertura e com vacinação.

*Roberto Dumas é economista e professor no Insper.


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