O teletrabalho foi formalmente inserido na legislação trabalhista brasileira com a edição da Lei nº 13.467/2017, conhecida como Reforma Trabalhista, e inserção dos artigos 75-A e seguintes na Consolidação das Leis Trabalhistas (“CLT”). Antes da Reforma, a possibilidade de atuar em teletrabalho já existia, mas a sua menção no texto normativo era tímida, na medida que o artigo 6º, da CLT, apenas mencionava que não havia diferenças entre “o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado, desde que esteja caracterizada a relação de emprego”.
Com a inclusão dos novos artigos, a legislação trabalhista passou a ter texto expresso autorizando a realização do teletrabalho, mediante o cumprimento de requisitos formais, como o registro da modalidade no contrato de trabalho e a previsão contratual sobre a aquisição dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura adequada e o reembolso de despesas, quando arcadas pelo empregado.
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Contudo, apesar da tentativa de dispor sobre o teletrabalho, muitos aspectos dessa modalidade de prestação de serviço ficaram de fora da regulamentação, o que implica em dúvidas por parte dos empregadores e dos empregados. Uma questão que não foi abordada com a Reforma Trabalhista foi justamente a possibilidade de contratação de empregados no exterior para atuar em teletrabalho.
Essa lacuna já foi identificada pelos legisladores, de modo que, em 2020, foi apresentado o Projeto de Lei nº 5581 perante a Câmara dos Deputados, para inserir na CLT disposições específicas sobre o teletrabalho realizado no exterior, tratando inclusive da inaplicabilidade das regras previstas na Lei nº 7.064/82 (Lei do Expatriado) ao empregado em regime de teletrabalho. Ainda não há previsão para a votação do Projeto de Lei.
De toda forma, nesse meio tempo, a jurisprudência e a doutrina trabalhista já vêm sinalizando positivamente a possibilidade de contratação de profissionais do exterior para atuar em teletrabalho, ou ainda, a possibilidade de um empregado alocado no Brasil continuar trabalhando para a empresa mesmo após a mudança para o exterior, desde que não seja a pedido da empresa, para evitar a aplicação da Lei do Expatriado.
Para a atuação do teletrabalho no exterior, é necessário estar atento a algumas questões além dos requisitos previstos nos artigos 75-A e ss. da CLT.
De início, supondo que não haverá possibilidade de o empregado deslocar-se até a sede ou localidade da empresa, deve-se planejar como a empresa irá atender a obrigação de realizar exames médicos admissionais em seus empregados, nos termos da Norma Regulamentadora nº 7. Ao longo do contrato, também será necessário ter atenção a realização de exames periódicos e demissional.
No dia a dia, a empresa deverá enfrentar os desafios na concessão de determinados benefícios aos empregados, como vale alimentação/refeição, plano de saúde, plano odontológico ou outros benefícios intrinsecamente ligados a localidade da sede da empresa, uma vez que a residência do empregado fora do Brasil poderá inviabilizar o gozo dos referidos benefícios.
Igualmente desafiador será a hipótese de o empregado no exterior sofrer um acidente de trabalho ou ser acometido por doença que requeira um afastamento superior a 15 (quinze) dias, visto que o afastamento demandará a realização de perícia médica in loco pelo órgão previdenciário brasileiro.
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Os empregadores e empregados também deverão estar atentos a eventual incompatibilidade de horário de prestação de serviços, considerando o fuso horário do país do empregado, bem como a existência de autorização do empregado para o trabalho e residência no exterior. Ainda que se esteja tratando de hipótese onde o empregado já resida no exterior ou que a iniciativa de mudança seja dele, e não da empresa, é considerado uma boa prática confirmar se o empregado possui autorização para permanecer legalmente em solo estrangeiro antes de autorizar o teletrabalho.
A ausência de legislação, bem como de doutrina e jurisprudência sobre o tema, torna recomendável uma análise caso a caso da viabilidade do teletrabalho do exterior. Com essa análise individualizada, será possível encontrar soluções mais adequadas para os desafios mencionados, de modo a reduzir a exposição do empregador.
*Cibelle Linero e Larissa Medeiros Rocha são, respectivamente, sócia e advogada da área trabalhista do BMA Advogados.
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