Novos marcos legais BR do Mar e BR dos Rios querem aumentar transporte por navegação

A expectativa do governo com o novo programa é que esse crescimento atinja níveis de 30% ao ano/Fotos Públicas
A expectativa do governo com o novo programa é que esse crescimento atinja níveis de 30% ao ano/Fotos Públicas
Apesar de os oito mil quilômetros de costa, o Brasil movimenta apenas 11% de sua carga por meio da navegação de cabotagem
Fecha de publicación: 03/11/2020

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A matriz de transportes brasileira convive com uma crise sintomática, associada a altos custos, ineficiências e perdas que se asseveram. O governo brasileiro, em uma tentativa de fomentar o crescimento do segmento navegação, submeteu recentemente o Projeto de Lei 4199/2020, o chamado BR do Mar (em alusão a estradas marítimas).

O BR do Mar é um programa de estímulo ao transporte de cabotagem, quer dizer a navegação entre portos brasileiros, e tem por objetivo ampliar a oferta de serviços, criar novas rotas, reduzir custos e aumentar a competitividade no setor.

Na última década o setor cresceu em média 10% ao ano. A expectativa do governo com o novo programa é que esse crescimento atinja níveis de 30% ao ano, com a atração de cerca de um trilhão de reais em investimentos privados, em um prazo de dez anos.

Apesar de os oito mil quilômetros de costa, o Brasil movimenta apenas 11% de sua carga por meio da navegação de cabotagem, uma vez que o transporte rodoviário responde por 65% dessa movimentação.

Uma das novidades interessantes trazidas pelo projeto de lei é permitir que empresas brasileiras de navegação que detenham frota nacional possam alugar (na modalidade casco nú) embarcações estrangeiras para ampliar suas operações e reduzir custos, tendo em vista que a legislação atual estabelece a obrigatoriedade de essas empresas encomendarem a construção de todas as suas embarcações em estaleiro nacional.

O programa BR Mar permite ainda que investidores estrangeiros constituam uma empresa brasileira de navegação (EBN), sem mais atender exigência da legislação atual, quer dizer, comprovar posse de embarcações brasileiras.

A proposta autoriza ainda empresas estrangeiras devidamente habilitadas a utilizarem os recursos do Fundo da Marinha Mercante para financiarem a manutenção (docagem) de suas embarcações em estaleiros brasileiros.

De um lado, abre-se a janela para que empresas nacionais operem embarcações estrangeiras (e até embarcações de suas subsidiárias no exterior) na navegação de cabotagem. Por outro, costura-se também a possibilidade de embarcações estrangeiras terem acesso a financiamento local de maneira que a docagem ocorra em estaleiro brasileiro, trazendo ganho de escala para as operações dos estaleiros nacionais.

Em que pese o fato de que um dos objetivos do projeto é a geração de empregos, será necessário entender com cuidado os impactos trabalhistas e comerciais. Uma das questões que merece atenção é o regime de contratação de marítimos que deverão operar as embarcações de bandeira estrangeira, alugadas pelas empresas nacionais, nas operações de cabotagem.

O artigo 12 do projeto, afretamento de embarcações, estabelece que a contratação de tripulantes deverá observar as regras aplicáveis ao pavilhão (bandeira de registro) da referida embarcação. Portanto, teríamos eventualmente circunstância em que empresa brasileira, alugando embarcação de bandeira estrangeira, para operar em águas jurisdicionais brasileiras, faria a contratação de brasileiros, em regime de contratação que deverá observar regras trabalhistas de outro país.

Interessante refletir sobre o tema. A princípio nos parece, revendo as Convenções do Trabalho Marítimo e regras da CLT – Decreto Lei 5452/1943, que o contrato de trabalho entre a empresa nacional afretadora, operando segundo as normas do BR do Mar, e os tripulantes de embarcação (casco nú) será regido, independentemente da bandeira da embarcação, pela legislação brasileira.

Na esteira do BR do Mar, o Ministério da Infraestrutura acaba de criar o BR dos Rios. Trata-se de um programa ainda em fase embrionária. Apesar de carecer de prazo para ser lançado, merece acompanhamento, uma vez que criará uma política pública, necessária para o desenvolvimento da navegação interior, quer dizer, explorando o grande potencial fluvial do país.

O trabalho se inicia com um diagnóstico do setor e certamente envolverá discussões sobre a privatização de hidrovias. A atuação privada no segmento terá por objetivo o aumento da eficiência logística dos rios, bem como melhoria na manutenção das referidas hidrovias.

Ambos os programas, a nosso ver, são necessários. Será interessante acompanhar se o movimento de flexibilização que permeou o BR do Mar vai contagiar também as regras do programa BR dos Rios. O transporte fluvial, entendido como estratégico pelo Ministério da Infraestrutura, tem caminhado de forma sólida na construção de alternativas para a exploração das hidrovias dos rios Madeira e Tapajós.

Tendo em vista as características ambientais favoráveis da operação fluvial em comparação a outros modais, imagina-se que a estruturação de projetos envolvendo o setor poderão, no futuro, obter benefícios da agenda conjunta desenvolvida pelo Ministério da Infraestrutura e a Climate Bonds Initiative (CBI). A certificação desses projetos como sustentáveis pela CBI poderá trazer benefícios de diversas ordens, especialmente de natureza tributária.

No que concerne ao BR dos Rios, o momento é propício para se envolver com a discussão e submeter sugestões ao programa. Esperamos que os novos marcos tragam a aceleração desejada para o setor.

 

*Adolpho Júlio Camargo de Carvalho é sócio do Pinheiro Neto Advogados.

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