Muito poucos clientes conseguirão sair ilesos da crise causada pelo coronavírus. Este acontecimento causou mudanças irreversíveis em muitas companhias. Aquelas que conseguirem sobreviver voltarão menores e menos robustas. A maioria das que sobreviverem o farão graças à ajuda do governo, mas verão sua capacidade de gastos comprometida.
Os escritórios de advocacia já enfrentam quedas na demanda em muitas de suas áreas de trabalho, além de atrasos nos prazos de pagamento e solicitações de descontos e amortizações por seus clientes. À medida que a crise se desenrola, os escritórios de advocacia precisam pensar em como lidarão com suas políticas de preços no futuro imediato.
Felizmente, já temos experiências reais derivadas de negociações com nossos clientes. Já aprendemos a lição sobre o que funcionou - e o que não funcionou - durante a última recessão que atingiu a maioria dos países após o colapso do Lehman Bros entre 2008 e 2009.
A estratégia prevalece sobre a tática
Algo que aprendemos é que os resultados são desfavoráveis quando deixamos que os sócios enfrentem sozinhos os problemas. Aqueles sócios que têm uma relação de longa data com um cliente serão suscetíveis a ceder rapidamente às suas solicitações, sem levar em conta as limitações que deveriam regir esses acordos nem o impacto que eles poderiam ter na firma em geral, se o resto dos clientes começar a exigir o mesmo tratamento.
Há um fato irrefutável: os sócios geralmente não são bons em negociar preços! Embora sejam treinados para realizar seu trabalho com altos padrões de qualidade, com frequencia ficam desconfortáveis quando precisam falar sobre dinheiro. Talvez essa seja uma das poucas situações em que o sócio comum sente que está na calçada diante do cliente.
Uma abordagem mais precisa é segmentar os clientes chave da firma usando uma grade 2 x 2, que inclui o tamanho do cliente em termos de preços em um eixo e sua lucratividade (ou tarifa média, se a lucratividade não puder ser calculada) no de outros.
Os clientes de muito lucro e tamanho grande serão a sua força - essa é a espinha dorsal da sua firma e você precisará protegê-la. Isso pode ser alcançado recorrendo ao valor agregado, algo que os clientes realmente apreciam (como vimos em conversas com eles) e o acerto de contratos com prazos predefinidos. Esses clientes são muito atraentes para a concorrência, sua tarefa principal será evitar perdê-los.
Clientes de poucos lucros e tamaño grande são um mal necessário. Eles são uma garantia de renda nos momentos em que as firmas não podem se dar ao luxo perder quantias significativas de honorários. Como esses clientes tendem a ser os mais sensíveis aos aumentos de preços, é necessário ter uma estratégia robusta ao propor qualquer ajuste de preço, pois está associado a um compromisso de longo prazo. A firma precisa entender que conta com uma uma fonte segura de renda, mesmo que não seja a mais rentável de todas.
Clientes de muitos ganhos e tamanho pequeno geralmente representam uma oportunidade real. É preciso identificar quais deles estão em posição de gastar mais (você receberá apenas uma pequena parte de seus pedidos). Nesse caso, você poderá demonstrar sua generosidade, pois os clientes se lembrarão de que sua firma investiu neles quando as condições do mercado eram desfavoráveis e eles retribuirão. Em momentos adversos, muitos escritórios de advocacia terão parte de sua força de trabalho associada à baixa carga de trabalho.
Esse pessoal pode ser designado para prestar serviços a esses tipos de clientes gratuitamente ou a um custo muito baixo. Por exemplo, esse cliente pode representar uma pequena quantidade de contrato de trabalho para uma determinada firma, mas gasta muito em trabalho normativo (com outras firmas). Se sua firma tiver funcionários jurídicos subempregados, você poderá designá-los para comissões de serviço para assessorar o cliente com trabalhos regulatórios (que pode ser feito virtualmente).
Esta estratégia gera muito valor a um custo mínimo para a firma. Pense em como os sócios também podem ajudar. Certa vez, um sócio-diretor me explicou que os sócios ociosos de sua firma eram seu pior pesadelo. Tanto o sócio quanto sua equipe perdem a motivação, mas há mais: eles até começam a dificultar o funcionamento da firma! Cada vez que os advogados da firma tiverem tempo de sobra, especialmente se forem sócios, é conveniente atribuir a eles um projeto que envolva a identificação e assistência a esses tipos de clientes. Isso os manterá ocupados e eles podem fornecer assistência valiosa aos clientes com potencial futuro para a firma.
Aqueles clientes de baixo lucro e tamanho pequeno não serão uma prioridade para a firma. Não concentre seus esforços neles, mas nos outros segmentos da sua base de clientes.
A negociação
Nestes tempos difíceis, é vital que os sócios desenvolvam suas habilidades para negociar com aqueles clientes que pedem descontos, extensões de prazo de pagamento ou mesmo trabalhos gratuitos. Em nossa experiência, a melhor solução é que os sócios “ganhem tempo” durante a conversa inicial. Trata-se de escutar atentamente o que o cliente quer e por que ele quer e explicar que primeiro deve discuti-lo com seus colegas, chefe de departamento, sócio-diretor ou qualquer outra pessoa da firma.
Isso permite que o sócio que recebeu a solicitação do cliente comece a explorar as possibilidades de intercâmbio disponíveis. O primeiro intercâmbio deveria ser uma flexibilização nos prazos - por exemplo, acordar uma tarifa especial aplicável durante os próximos seis meses. Sempre deve ficar claro que a tarifa será ajustada ao final do período. Dessa forma, uma vez vencido o prazo, não será necessário ter outra conversa incômoda.
Não devemos esquecer que os escritórios de advocacia também foram afetados pela pandemia; portanto, os sócios devem identificar que outros benefícios podem obter de seus clientes nesse intercâmbio. Poderíamos considerar, por exemplo, se o cliente pode nos oferecer trabalhos em uma nova área de especialidade ou se ele pode incorporar nossa firma em outra área de seus negócios ou talvez entrar em contato com outras companhias do setor.
É crucial que os sócios recebam treinamento para desenvolver essas habilidades. Quando os clientes percebem que os sócios sempre cedem às solicitações, eles tendem a exigir cada vez mais. Uma abordagem apropriada e profissional para essa situação é mostrar a seus clientes suas habilidades de negociação, bem como um interesse genuíno em cuidar de seus negócios e de sua própria firma. Descobrimos que colocar essa abordagem em prática geralmente traz resultados positivos. Se os sócios, por meio de exercícios, simulam essas negociações com seus colegas antes de terem que enfrentar as conversas reais com seus clientes, os resultados são ainda melhores.
*Kevin Doolan, The Møller Institute, com sede no Churchill College, Universidade de Cambridge.
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