Fundos de pensão e Covid-19

Qual será o impacto nas operações e viabilidade econômica dos fundos de pensão e das próprias empresas patrocinadoras?/Pixabay
Qual será o impacto nas operações e viabilidade econômica dos fundos de pensão e das próprias empresas patrocinadoras?/Pixabay
Quais são os impactos no setor causados pela pandemia.
Fecha de publicación: 13/05/2020
Etiquetas: Brasil

Diante do momento particular pelo qual passamos e recomendação de quarentena em quase todo o mundo em razão da Covid-19, aguarda-se do órgão fiscalizador das entidades fechadas de previdência complementar, a Previc, atitudes proativas e um posicionamento que fomente a continuidade do negócio, traga tranquilidade e segurança jurídica às entidades para enfrentarem situação tão adversa.

 

A atividade econômica está sofrendo os impactos trazidos pela pandemia, o que pode ser verificado nas previsões econômicas, em que já se fala em expectativa de retração para o PIB brasileiro em 2020 superior a 4%.

 

Fato é que há muito a acontecer e a ser feito. Neste sentido, seria prudente o início de um amplo e proveitoso diálogo entre a Previc com suas fiscalizadas no intuito de prover soluções para o caso de não cumprimento de suas obrigações diante do estado de calamidade decretado (força maior), assim como para orientar as entidades frente a medidas que visem a continuidade do negócio e proteção dos ativos dos planos previdenciários.

 

A única inércia atualmente esperada diz respeito aos atos de fiscalização, os quais, se necessários, devem estar restritos à busca de informações que objetivem a suavização do impacto da Covid-19 no sistema de previdência complementar.

 

Notemos que, ao realizar tal movimento, estaria a Previc indo ao encontro das melhores práticas internacionais considerando, por exemplo, o caso do mercado de seguros e previdência da União Europeia. A Eiopa (órgão regulador de seguros e dos fundos de pensão na Europa) publicou declaração e recomendações para mitigação dos impactos trazidos pela Covid-19 no setor de seguros adiando, por exemplo, o prazo de entrega de relatórios de fechamento do ano de 2019.

 

Considerando esse momento particular, reconhecemos que seria prudente a manifestação da Previc no sentido de adaptação de suas regras às melhores práticas internacionais aplicáveis para o momento. Houve uma considerável alteração nas rotinas dos fundos de pensão, o que ocasiona dificuldades para o cumprimento de um universo de obrigações. A decisão da autarquia prorrogando em 30 dias os prazos para entrega de documentos e informações previstas para os meses de março e abril é um aceno nesse sentido.

 

Ponderando um quadro de incertezas, qual será o impacto nas operações e viabilidade econômica dos fundos de pensão e das próprias empresas patrocinadoras? Alguns cenários de variadas complexidades são vislumbrados, dentre os quais podemos destacar:

 

  • Eventuais demissões de empregados afetam de que maneira o plano de aposentadoria? Alguns empregados podem ser colocados em licença (remunerada ou não remunerada). Durante esse período restam suspensas suas contribuições para o plano? O Governo Federal está considerando uma legislação para ajudar empregados e empregadores durante esta pandemia de maneira que isso impacte nos planos privados de aposentadoria?
  • Possível solicitação de interrupção de contribuições por parte dos participantes, refletindo nas reservas dos planos. Dentro de um cenário de possíveis demissões, causando uma descontinuidade no ciclo das contribuições, qual impacto na formação das reservas?
  • Diante da relação contratual havida, participantes poderiam arguir força maior e desequilíbrio contratual (393 e 478 do Código Civil) a fim de forçar judicialmente o resgate de suas contribuições?
  • À medida em que o ambiente de negócios muda rapidamente, as empresas analisam todas as despesas e alternativas, incluindo a possibilidade de redução de suas contribuições. Até que ponto poderia a patrocinadora requerer alteração no plano para reduzir benefícios, diminuir ou interromper contribuições visando equalizar suas despesas? Importante salientar que os planos que reduzem ou interrompem as contribuições devem satisfazer critérios objetivos de não discriminação. As patrocinadoras devem discutir com os órgãos de governança das entidades de previdência os métodos e as consequências de uma possível interrupção das contribuições para o plano.
  • No que tange às operações de empréstimos e financiamentos para participantes e assistidos, pode ocorrer uma maior demanda de solicitações neste período. As entidades de previdência desejam revisar seus regulamentos de operações com participantes para lidarem com o atual cenário de maior risco de crédito? Como serão tratadas as prováveis renegociações e solicitações de novos valores?
  • Considerando a volatilidade do mercado financeiro e o cenário de juros baixos, quais as lições deste início de crise e suas implicações nas políticas de investimento das entidades? Seria prudente a revisitação das políticas de investimento de seus planos previdenciários num curto espaço de tempo e a verificação da adequação de seus parâmetros ao imprevisível momento do mercado?
  • A educação financeira dos participantes para a área de investimentos é essencial neste momento. Possibilitar recursos técnicos a fim de auxiliá-los a compreender o momento particular pelo qual estamos passando seria essencial. Estariam os participantes devidamente instruídos e informados para suas escolhas de perfil de investimento diante da atual volatilidade do mercado?
  • Em matéria de segurança de dados, à medida que o distanciamento social ocorre e os mercados financeiros exibem volatilidade, é provável que mais participantes acessem eletronicamente as contas do plano de aposentadoria para entender seus benefícios. Usuários não autorizados provavelmente também tentarão acessar as contas de participantes/beneficiários. As entidades de previdência, além da adaptação aos aspectos da LGPD, devem reforçar suas medidas de segurança na proteção dos dados de seus usuários.

Como podemos verificar, são muitos os desafios e questionamentos que surgem. Enfatizamos a necessidade de um posicionamento pragmático do órgão fiscalizador, que traga tranquilidade às entidades para o enfrentamento de algumas dessas primordiais questões, concedendo-lhes prazo, orientação e fôlego operacional.

 

Mais do que nunca, diante das incertezas, as decisões deverão obedecer a mais estrita governança, sendo fundamentadas e formalizadas, de modo a comprovar a necessidade das medidas para o benefício do plano previdenciário, seus participantes e assistidos.

 

Nas palavras de Antoine de Saint-Exupéry, “Cada um é responsável por todos. Cada um sozinho é responsável. Cada um é o único responsável por todos”. Individualmente e unidos, venceremos este momento.

 

*Juliano Barra e Carlos Alberto Barros são sócios do setor de previdência do GVBG - Gentil, Monteiro, Vicentini, Beringhs e Gil Advogados.

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