O novo Marco Legal de Licitações (Lei nº 14.133/2021) já está vigente e vai gerar alguns impactos e oportunidades no mercado de seguros. Em vigor desde abril deste ano, o dispositivo prevê um prazo de vacatio legis de dois anos, que será essencial para que os agentes públicos e os entes privados se adaptem às modificações introduzidas pelo novo texto legal ao universo das contratações públicas.
No mercado de seguros, o vacatio legis será importante para a adaptação das companhias seguradoras, que serão diretamente afetadas pelas novas disposições legais no que se refere à emissão de apólices de seguro garantia, bem como para a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), que já está trabalhando na modificação do texto de sua Circular nº 477/2013 (Circular Susep 477), que dispõe sobre o seguro garantia e divulga as condições padronizadas.
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Assim como ocorria na lei anterior de licitações (Lei nº 8.666/93), o Novo Marco Legal de Licitações prevê que a autoridade competente terá a discricionariedade para exigir a prestação de garantia nas contratações de obras, serviços e fornecimentos, podendo o contratado optar por uma das três modalidades elencadas no parágrafo primeiro de seu artigo 96, quais sejam a caução em dinheiro, fiança bancária e o seguro garantia.
Pela nova definição, o seguro garantia é o seguro que garante o fiel cumprimento das obrigações assumidas pelo contratado. Nota-se que não se restringe mais a garantir as obrigações assumidas por empresas, conforme estabelecia o artigo 6º da Lei nº 8.666/93. Esta garantia poderá ser utilizada inclusive por pessoas físicas, o que pode criar oportunidades de negócios no mercado segurador.
Uma das mais aguardadas mudanças trazidas pelo Novo Marco Legal das Licitações era o aumento do valor proporcional da garantia.
O valor da garantia, que sob o manto da Lei nº 8.666/93, não podia exceder a 5% do valor do contrato e apenas para obras, serviços e fornecimentos de grande vulto envolvendo alta complexidade técnica e riscos financeiros consideráveis, desde que demonstrado através de parecer tecnicamente aprovado pela autoridade competente, poderia ser elevado para até 10%, passa a ser de 5% do valor inicial do contrato, podendo esse percentual ser majorado em até 10%, desde que justificada pela complexidade técnica e riscos envolvidos.
O percentual da garantia nas obras e serviços de engenharia de grande vulto, que sob a luz da Lei nº 8.666/93, ainda vigente, é de até 10% (dez por cento) do valor do contrato, passará a ser de até 30% (trinta por cento) do valor inicial do contrato.
Outra grande expressiva mudança trazida pelo texto da Lei nº 14.133/2021 é o valor atribuído a uma obra ou serviços para ser classificada como de grande vulto. A Lei nº 8.666/93, que hoje considera aqueles cujo valor estimado seja superior a R$ 37, 5 milhões passará a ser aqueles que ultrapassem R$ 200 milhões.
E por qual motivo essa mudança no regime licitatório é tão relevante no mercado de seguros? O legislador determinou que nenhum outro tipo de garantia exceto o seguro garantia poderá ultrapassar o limite de 10% do valor inicial do contrato atingindo o patamar de 30%, tirando do contratado a prerrogativa de optar por outro tipo de garantia, como, por exemplo, a caução em dinheiro e a fiança bancária.
A justificativa revela-se pela preocupação com as inúmeras obras inacabadas espalhadas pelo Brasil e a solução oferecida pelo seguro garantia. Somente este, em caso de inadimplemento pelo contratado, permite que o garantidor, no caso a seguradora, assuma a execução e conclua o objeto do contrato. Este mecanismo é denominado como cláusula de retomada, prevista no artigo 102 desta lei.
O step-in, como é conhecida a cláusula de retomada, está previsto no ordenamento jurídico brasileiro desde 2015, por meio da Lei nº 13.097, que alterou a redação da Lei de Concessões nº 8.987/1995 e da Lei das Parcerias Público Privadas nº 11.079/2004, pela qual previu-se a possibilidade dos financiadores e garantidores do projeto procederem à assunção do controle ou da administração temporária da concessionária para promover sua reestruturação financeira e assegurar a continuidade da prestação dos serviços.
No âmbito do seguro garantia, a Circular SUSEP 477 já previa a possibilidade de a seguradora executar o objeto do contrato garantido na hipótese de inadimplemento do contratado ao invés de proceder com a indenização em dinheiro dos prejuízos experimentados pelo contratante.
Ressalta-se que, se previsto no edital, a retomada da obra não é mandatória à seguradora detentora do risco, já que o novo texto legal concede discricionariedade à seguradora em optar entre realizar o step-in e executar e concluir o objeto do contrato ou pagar a integralidade da importância segurada da apólice.
Importante pontuar que o Novo Marco Legal de Licitações não condiciona a cláusula de retomada apenas às obras e serviços de grande vulto, deixando a possibilidade de previsão do step-in pela administração em seus editais de licitação em todas as contratações de obras e serviços de engenharia de diferentes montas.
Outro destaque do Novo Marco Legal de Licitações é a possibilidade de previsão de uma matriz de risco, que consiste em cláusula contratual definidora de riscos e de responsabilidades entre as partes e caracterizadora do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, em termos de ônus financeiro decorrente de eventos supervenientes à contratação.
Os riscos deverão ser alocados entre contratante e contratado, mediante indicação daqueles a serem assumidos pelo setor público ou pelo setor privado ou daqueles a serem compartilhados. Os riscos que tenham cobertura oferecida por seguradoras serão preferencialmente transferidos ao contratado.
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Ou seja, uma das principais ferramentas a serem utilizadas para mitigação de riscos é o próprio contrato de seguro, seja ele o de riscos de engenharia e de responsabilidade civil geral, de transportes, de responsabilidade civil profissional e até mesmo seguro de responsabilidade civil ambiental, bem como outras modalidades do próprio seguro garantia.
Assim, o Novo Marco Legal de Licitações não revolucionará apenas a forma que atualmente se opera o seguro garantia, mas também representa a criação de novas oportunidades para todo o mercado de seguros.
*Ricardo Ribeiro da Luz Loew é advogado e sócio e Heliodora D’Aprile é advogada do DR&A Advogados.
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