A pandemia afetou o setor de infraestrutura no Brasil em várias frentes. Segundo especialistas, desorganizou e distorceu indicadores econômicos, prejudicando estimativas de produção, logística e consumo, por exemplo. Na área regulatória, a Covid-19 acarretou atrasos no andamento de algumas reformas importantes, como a do setor elétrico. A crise também diminuiu o apetite dos investidores, mas o mercado jurídico não para e deve atuar em algumas frentes importantes, apesar do ano de eleições que geralmente diminui o fluxo de atividades.
A joia da coroa nesse processo é o saneamento básico, que teve um novo marco legal aprovado em 2020 e deve atrair boa parte da atenção desses investimentos, de acordo com a agência de classificação de risco S&P Global Ratings. Há novas possibilidades de licitações nos mais de 5 mil municípios brasileiros. Advogados e escritórios têm grande expectativa na privatização dessas companhias. Muitas firmas estão se estruturando para atender ao enorme volume de novos projetos e investimentos que o setor demandará nos próximos anos.
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A lei em vigor institui a meta de viabilizar a universalização dos serviços de água e esgoto e torna obrigatória a abertura de licitação, envolvendo empresas públicas e privadas, o que estimula a livre concorrência, competitividade, sustentabilidade econômica e a eficiência na prestação de serviços. E estabelece como meta, tanto para os contratos vigentes como para os firmados, o dever das empresas de ampliar o fornecimento de água para 99% da população e de coleta e tratamento de esgoto para 90% da população até dezembro de 2033.
Outra mudança significativa diz respeito à assistência aos pequenos municípios do interior, que, geralmente, possuem pouco recursos ou não tem cobertura de saneamento, com o objetivo de evitar que empresas forneçam serviços apenas pautadas pelos seus próprios interesses para localidades com maior rentabilidade. Agora estados podem formar grupos ou blocos de municípios, que poderão contratar coletivamente os serviços.
Transportes
Um dos setores mais afetados pela pandemia foi o de infraestrutura de transportes (rodoviários, aeroportuários, ferroviários, metroviários, aquaviários), principalmente pelas medidas de restrição de circulação de pessoas e cargas no território nacional.
A mudança no padrão de vida e de consumo também deve influenciar nas operações. Para os especialistas, duas alternativas são capazes de conferir o fôlego necessário à infraestrutura de transportes: a renovação/prorrogação antecipada de concessões (pagamento imediato do valor da outorga ao Poder concedente, conferindo ao concessionário a exploração do serviço por mais tempo para viabilizar a amortização, o retorno de seus investimentos) e a relicitação (devolução do contrato, asseguradas as respectivas indenizações, e nova licitação).
Na área de portos, o setor bateu recorde de movimentação de cargas em 2021, com 1,21 bilhão de toneladas transportadas, um crescimento de 4,8% em relação a 2020, de acordo com o Anuário Estatístico da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq). De olho nessa movimentação, foram realizados 52 contratos de concessões de terminais portuários, principalmente empresas estrangeiras.
“Espera-se que nas mãos de operadores privados os portos tragam dinamismo e flexibilidade para o escoamento da produção e, principalmente, a otimização dos custos logísticos”, afirma Luis Fernando Biazin Zenid, advogado e sócio na área de Infraestrutura do escritório Donelli e Abreu Sodré Advogados.
No setor aeroportuário, o modelo de concessão já é mais consolidado, tendo atraído bilhões de investimentos nos últimos anos. É esperada para 2022 a sua sétima rodada de concessões de aeroportos. Uma das novidades será a criação de um bloco destinado para a aviação executiva, onde farão parte os aeroportos Campo de Marte, em São Paulo, e Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. A intenção do Ministério da Infraestrutura é abrir espaço para investidores especializados neste tipo de operação.
A dúvida do momento é em relação ao apetite do mercado para alguns dos principais ativos: há o plano de licitar o Santos Dumont, no Rio de Janeiro, de forma isolada. Já Congonhas, em São Paulo, irá compor um bloco com outros dez aeroportos de menor porte em outros três estados.
Em relação às ferrovias, o novo marco legal está em discussão no Senado desde 2018. O PLS 261/2018 tem potencial para destravar projetos e investimentos na ordem dos bilhões de reais. A Proposta de Legislação Federal pretende estabelecer novo marco regulatório para o setor ferroviário e apresenta regras para exploração das ferrovias em regime de direito público (concessões e permissões) e privado (autorizações), bem como prevê a possibilidade de autorregulação do setor.
Uma das principais novidades da proposta diz respeito à outorga de autorizações para exploração das ferrovias em regime de direito privado, de forma semelhante ao que já foi feito no setor portuário e no de telecomunicações.
A retomada do crescimento do setor de transportes tem sido impulsionada também pela renovação antecipada de concessões, para viabilizar investimentos e aumentar a capacidade, inclusive por meio de investimentos cruzados.
“Projetos de infraestrutura demandam altos investimentos, em contratos de longo em prazo e tendem a gerar grande impacto, tais características demandam planejamento não somente por parte dos órgãos públicos, mas também dos entes privados. Estes últimos muitas vezes têm um espaço curto de tempo para estudar os projetos e, principalmente, buscar recursos”, diz Zenid .
Energia
O mercado de iluminação pública brasileiro, por meio de concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs), vem se consolidando e já tem contratado para os próximos anos investimentos de R$ 18 bilhões em apenas 51 municípios brasileiros, sendo nove capitais. Para além dos contratos assinados existem mais de 400 projetos em andamento no país, sendo 229 através de consórcios municipais, especialmente nos estados de Minas Gerais e Bahia.
A tendência é de que as fontes renováveis não hídricas continuem a ganhar espaço na matriz energética, como as energias eólica e solar, sobretudo na região Nordeste, segundo os advogados do setor. Por conta disso, boas oportunidades são esperadas nos próximos anos.
De acordo com os especialistas da área, as empresas inovadoras já estão migrando para o mercado livre, buscando soluções criativas e mais baratas, como geração distribuída e operações estruturadas de compra e venda de energia (chamados Corporate PPA). Outra possibilidade de inovação para o setor pode estar na fonte de recursos, o funding.
Por conta disso, a demanda das empresas interessadas terá que se adequar às recomendações do Plano Nacional de Energia (PNE) 2050, a exemplo do aperfeiçoamento do marco regulatório para incentivar o investimento em projetos eólicos offshore e debater os impactos do texto resultante da MP 950 para a sustentabilidade do setor elétrico.
A aprovação na semana passada pela Câmara dos Deputados da adesão do Brasil à Aliança Solar Internacional – ASI (International Solar Alliance – ISA, em inglês), coalisão intergovernamental que reúne as nações com os melhores recursos solares do planeta, é uma medida estratégica para ampliar o protagonismo brasileiro no uso e desenvolvimento da tecnologia solar fotovoltaica no cenário mundial.
O país, segundo os especialistas, tem um dos melhores recursos solares do planeta, mas está atrasado frente aos demais países no uso da energia solar fotovoltaica. Em 2021 ficou na 14ª posição no ranking mundial da energia solar, muito abaixo do potencial do setor.
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“Precisamos recuperar o tempo perdido e nossa participação plena na ASI contribuirá para que possamos incorporar as melhores práticas internacionais, acelerar o desenvolvimento da fonte solar fotovoltaica em nosso país e nos posicionarmos como um ator relevante neste setor, cada vez mais estratégico no cenário mundial”, explica Rodrigo Sauaia, da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).
Independente do setor, para os advogados especializados, nesse momento que ainda é de crise não existem soluções fáceis. O cenário permanece parecido com o de 2020 em vários aspectos: muitas empresas buscam proteção contra a crise e maior entendimento das normas regulatórias e restrições dos órgãos. Outras já estão retomando as operações, o que deve gerar disputas de eventuais contenciosos. No fim, os clientes precisarão se renovar para atuar no novo normal do mercado de infraestrutura.
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