Justiça trabalhista poderia adotar “jurisprudência de crise” durante pandemia?

Entendimentos excepcionais durante Covid-19 seriam alternativa, afirmam advogados.
Fecha de publicación: 16/04/2020
Etiquetas: Brasil

A economia brasileira, já afetada por anos de recessão e recuperação econômica lenta, vê na pandemia causada pelo novo coronavírus a mais séria ameaça. A paralisação da economia coloca em risco o emprego de milhões de trabalhadores das  mais diversas áreas. E mesmo quem está trabalhando tem o que contestar. Desde a incapacidade de se voltar ao trabalho a quem está trabalhando demais e sem os insumos necessários nesta época, a Justiça do Trabalho deve pacificar as questões envolvendo empregados e empregadores.

Seria o momento de uma "jurisprudência de crise"?  Para o sócio do escritório Corrêa da Veiga Advogados, Maurício Corrêa da Veiga, o momento drástico pode abrir caminho para soluções drásticas: "Vai haver uma jurisprudência específica para tratar deste momento atual", ponderou. 

Com a sobrevivência de micro, pequenas e médias empresas em risco, entende o advogado trabalhista, esta é uma pergunta que se passa na cabeça de todos no setor no momento. Um exemplo, apontou o advogado, vem da questão do teletrabalho - adotado em massa por empregadores cujas atividades não são consideradas essenciais. "É difícil enquadrar o teletrabalho em todos os preceitos constitucionais existentes sobre o trabalho", analisou. 

Um ponto, ressalta Corrêa da Veiga, é certo: "Não vão poder se julgar com os olhos de antes, pois não é uma situação normal". E uma visão legal diferenciada para este fato, na visão do advogado, deveria existir até depois do fim da pandemia.

"Deveria durar ao menos 60 dias após o final deste estado de calamidade. No momento em que acaba a crise, há uma outra etapa – a retomada, que é tão traumática quanto", alertou.

Outras medidas apontadas como soluções para este impasse, tais como a redução de jornada e de salários, precisam evitar descumprir a carta magna, e também discussões históricas. "Tirando essas situações do contexto atual, já há uma carga negativa para o empregado, ao se flexibilizar o preceito constitucional da irredutibilidade salarial", apontou a sócia da área trabalhista do Chenut Oliveira Santiago, Mariana Machado Pedroso. 

"Mas se há uma transferência desta situação para um quadro de excepcionalidade, onde empregadores não estão produzindo e o fluxo de caixa é menor (salvo raríssimas exceções), ninguém está a salvo. Eles [os empregadores] também não estariam fazendo esforços para que estes postos de trabalho sejam mantidos?", questionou Mariana.. 

Para a sócia da área trabalhista do Costa Tavares Paes Advogados, Cristina Buchignani, a análise dos casos deverá levar em consideração o momento e o dinamismo que a situação exige, mas que isso ainda não é suficiente para determinar que a lei não seja aplicada.

"Ainda é um pouco precário se afirmar neste momento que a jurisprudência será neste ou naquele sentido, ou que validará de forma absoluta as disposições legais específicas deste momento tão inusitado", comentou.

O sócio do Peixoto & Cury Advogados, Antonio Carlos Aguiar, entende que o sistema trabalhista não tem lidado bem com gargalos específicos, que podem se agravar junto com a crise. "O número de acordos é muito grande, sendo muitos deles travados individualmente. Não tenho dúvida de que estas celebrações são possíveis, mas restam dúvidas sobre como isso se dará no futuro", afirmou Aguiar. 

Para ele, a decisão do ministro Ricardo Lewandowski dada no início do mês, de que sindicatos poderiam participar da negociação salarial de empregados por conta da MP 936, como possível ponto de insegurança jurídica. "A decisão deixou mais dúvidas do que as esclareceu", comentou. 

Para este impasse envolvendo a atuação com sindicatos, Cristina propõe uma solução: as partes interessadas deveriam investir mais tempo na atuação com entidades patronais, para a produção de convenções coletivas relativas a este momento, já que sindicatos profissionais e empresas não teriam musculatura para tantas negociações individuais e coletivas dentro de cada empresa.

"Esta convenção coletiva é algo mais ágil, com mais possibilidade de conclusão de negociações efetivas e mais abrangentes, com eficácia resguardada", afirmou a advogada. "Não é bom só para a empresa; o sindicato profissional consegue abranger com mais velocidade um número maior de trabalhadores, assim como empresas abarcadas pelo sindicato patronal".

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