O lado pouco conhecido do negócio jurídico

O 'management' continua sendo o “lado pouco conhecido dos negócios dedicados ao Direito” / R.D. Smith, Unsplash
O 'management' continua sendo o “lado pouco conhecido dos negócios dedicados ao Direito” / R.D. Smith, Unsplash
A gestão não profissionalizada como era há 30 anos não faz mais sentido e ser latino não deve nos impedir de ser globais ou competitivos
Fecha de publicación: 05/07/2021
Etiquetas: Gestão LexLatin

Será que o DNA imprime tanto o caráter que ser latino nos faz menos capazes para destacar no panorama da advocacia mundial ou são outras as razões que explicam que as maiores e mais poderosas firmas de advogados do mundo, com alguma mínima exceção, são anglo-saxãs? Neste artigo apontarei uma das razões que acredito que melhor explicam a diferença entre umas e outras e me permitirei fazer algumas recomendações para aquelas firmas ibero-americanas cujo propósito é ser global e trabalhar para as empresas líderes do mundo.

Vantagens da profissionalização da gestão de um escritório de advogados

Desde 2003, com algum breve recesso que ajuda a abrir a mente, dedico muito do meu tempo ao assessoramento de escritórios de advogados e sobretudo para ajudar a construir marcas potentes e desenvolver negócios. Quando comecei sobravam dedos da mão para contar os profissionais que se dedicavam a isso, assim, para não me sentir tão sozinha, tive que buscar inspiração e ajuda fora.

Naquela época, tanto no Reino Unido como nos Estados Unidos, havia associações de profissionais especializados em "management de firmas de advogados”, os organismos equivalentes aos nossos colégios de advogados (os chamados “bars”) formavam e informavam sobre estes temas e também havia livros sobre a matéria, todos escritos em inglês. Ou seja, quando a Espanha estava começando, esses países já tinham uma doutrina consolidada, informação e formação de qualidade, encontros profissionais e grupos de apoio sólidos.

Tudo isso era possível porque as firmas de advogados desses países já estavam realizando uma aposta clara pela profissionalização da sua gestão e a comunidade de profissionais dedicados ao management era suficientemente numerosa para justificar a edição de obras, a organização de congressos e atividades de formação ou a fundação de associações dedicadas a estes temas. 

O lado pouco conhecido do mundo do Direito

E o que aconteceu enquanto isso no âmbito ibero-americano da advocacia? Algo muito diferente. O management continua sendo o “lado pouco conhecido dos negócios dedicados ao Direito”. Eu gosto de utilizar essa expressão porque acredito que descreve muito bem a situação de muitos profissionais ibero-americanos, com formações e experiências excepcionais, que optaram por trabalhar para firmas de advogados apoiando sua gestão.

Em geral, são profissionais que atuam nas sombras, os chamados “back office”, cujas áreas de trabalho são internamente consideradas centros de custo e não potenciais geradores de negócios. Muitas vezes, esses especialistas mudam de escritório, porque é a única maneira que eles encontram para se desenvolver profissionalmente. Essas mudanças de firma abalam a "abandonada", que por sua vez tem que procurar um substituto, esperar que este se acostume à cultura da organização até que seja capaz de agregar valor.

Em poucas firmas ibero-americanas, os profissionais do lado pouco conhecido participam dos órgãos de decisão e poder, quando muito estão integrados em comitês de direção, mas seu papel não é de definição estratégica senão de execução desta.

A profissionalização como ferramenta de diferenciação dos escritórios de advogados

No meu último artigo publicado “Sua firma de advocacia é uma firma zumbi?” expus a importância de que as firmas de advogados se diferenciem para sobreviver. Pois bem, a profissionalização da gestão é, na minha experiência, possivelmente a chave da diferenciação e a causa que explica o êxito ou não êxito dos escritórios de advogados.

Os primeiros têm sempre ou quase sempre um responsável de gestão de pessoas e equipes; outro de gestão do conhecimento, inovação, tecnologia e sistemas; um de desenvolvimento de negócios; outro de finanças. Estes são os quatro pilares sobre os quais é estruturada uma firma de advogados.

Se não são sólidos, a estratégia cambaleia. Os escritórios profissionais devem ter uma estratégia clara que contemple objetivos SMART (específicos, mensuráveis, alcançáveis, relevantes e temporários) ao menos sobre aspectos relativos às pessoas (atração, retenção, formação e carreira); o conhecimento (captação, organização, compartilhamento, digitalização); o marketing, a comunicação, o desenvolvimento de negócios e as vendas; a tecnologia (mudança cultural, aquisição e implementação de tecnologia, formação) ou as finanças (gestão de cobranças, pressupostos, tesouraria, KPI). E uma estratégia SMART requer contar com uma equipe SMART para tornar realidade.

E, de fato, as empresas anglo-saxãs vêm demonstrando há mais de 30 anos que a profissionalização é a melhor maneira de crescer e o fazem com sucesso. Gerenciar com eficiência o conhecimento, o talento, as finanças, as instalações ou a tecnologia, não quando sentimos vontade ou há um problema, mas sempre, é a única fórmula para ser uma firma global líder e isso requer investimento para atrair os melhores profissionais e recompensá-los e oferecer para eles uma carreira compatível com seu nível de experiência e conhecimento.

A necessidade urgente de iluminar o lado pouco conhecido do Direito

Hoje as áreas de apoio devem ser consideradas áreas de negócios e não apenas centros de custos, pois delas depende a tão necessária diferenciação. Dirigir essas áreas de apoio ou gestão da firma, sob a filosofia de que, embora impliquem um custo, são tantos os benefícios que se podem obter delas, que é possível contemplá-las também com um centro de renda.

E para isso é indispensável:

1. Que os profissionais dedicados à gestão tenham as mesmas oportunidades de crescimento no escritório que os advogados. Proporcionar a esses profissionais possibilidades claras de desenvolvimento de carreira, inclusive como opção entre as possíveis, desde que obviamente merecido, tornarem-se sócios da firma.

2. Que a passagem da função de advogado a administrador, algo que ocorre com frequência, não seja considerada um passo atrás, mas sim uma mudança de carreira.

3. Investir na contratação de profissionais de alto nível, pois os desafios dos escritórios de advocacia não são poucos nem fáceis.

4. Envolver os profissionais do lado pouco conhecido nos órgãos de poder para que possam contribuir com seu grão de areia para a estratégia.

Conclusão

Se queremos escritórios de advocacia ibero-americanos capazes de prestar serviço às empresas do futuro, agora juridicamente atendidas principalmente por escritórios anglo-saxões, precisamos de uma gestão mais profissionalizada e isso só pode ser feito pelos melhores e mais motivados profissionais. Por isso, convido os escritórios de advocacia ibero-americanos a refletirem sobre o seu futuro, tendo como prioridade a profissionalização da gestão e oferecendo a quem se responsabilizar uma carreira atrativa. A gestão não profissionalizada, como era há 30 anos, hoje não faz sentido e ser latino não deve impedir que sejamos globais ou competitivos.

*María Jesús González-Espejo, CEO do Instituto de Innovación Legal e presidente da Innovation in Law Studies Alliance. E-mail: [email protected] 

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