O que muda com aumento da cooperação tributária internacional

O Brasil é plenamente aderente a essa tendência que, entre nós, teve divisor de águas em 2016/Pixabay
O Brasil é plenamente aderente a essa tendência que, entre nós, teve divisor de águas em 2016/Pixabay
Em 10 anos, trocas de informações permitiram receitas adicionais de R$ 45,3 bi.
Fecha de publicación: 29/06/2021

A última década foi marcada por imensa expansão dos mecanismos de cooperação internacional tributária. Exemplo marcante é o das trocas automáticas de informação bancária entre fiscos, que se operam sem qualquer solicitação prévia pelo estado beneficiado, sob modelos CRS (abrangência mundial) e Fatca (restrita aos EUA).

 

Segundo dados oficiais da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em 10 anos as trocas de informações permitiram aos países membros receitas tributárias adicionais de aproximadamente R$ 45,3 bilhões (€ 7,5 bilhões). Apenas em 2019 (últimos dados disponíveis), os países membros trocaram informações sobre 84 milhões de contas bancárias, compreendendo ativos totais de € 10 trilhões.

 

O Brasil é plenamente aderente a essa tendência que, entre nós, teve divisor de águas em 2016. Nesse mesmo ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) revisou entendimento antigo para autorizar envio de informações bancárias ao fisco sem prévia autorização judicial. Foi lançado o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT), com 25 mil aderentes e R$ 51 bilhões em imposto e multa arrecadados. Criou-se a Declaração País a País (DPP) para compartilhamento internacional de informações fiscais sobre multinacionais.

 

Adotou-se a obrigação de abertura do beneficiário final de pessoas inscritas no CNPJ e o Brasil aderiu à Convenção Multilateral sobre Assistência Mútua em Matéria Tributária da OCDE. Com mais de 120 membros, ela é hoje o instrumento mais completo e moderno para cooperação entre fiscos. Além de trocas a pedido ou automáticas, a base do CRS, a convenção multilateral também autoriza pedidos de informação conjuntos, investigações setoriais e diligências no exterior.


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Passados 5 anos, já se pode fazer balanço e apontar perspectivas. O prazo para fiscalização de aderentes ao RERCT entra em sua reta final, entregas de DPP e abertura de beneficiário final viraram rotina dos contribuintes e, principalmente, a cooperação fiscal internacional se tornou uma realidade. Segundo informações oficiais, apenas em 2019 (últimos dados disponíveis), a Receita Federal recebeu informações sobre 60 mil contas bancárias nos EUA e outras 860 mil em 96 países.

 

Apenas da Suíça foram reportadas 47 mil contas. Essas informações são incorporadas à base de dados do fisco para cruzamentos e auditorias. Antes das trocas automáticas, o recurso pelo Brasil à cooperação fiscal internacional era limitado. Para se ter uma ideia, nos 10 anos anteriores, o País havia respondido a apenas 390 pedidos de cooperação.

 

Esse grande passo foi orientado por importantes preocupações arrecadatórias, que já se traduziram em aumento de eficiência na tributação de valores e ativos no exterior. Por outro lado, muitas dessas medidas foram tomadas sob inspiração estrangeira, em detrimento de garantias tradicionais dos contribuintes que agora merecem atenção.

 

As preocupações se verificam sobretudo nos casos em que não sejam assegurados direitos formais e materiais que são típicos da fiscalização tributária no Brasil. Assim, abriu-se uma nova frente de relações com o fisco por contribuintes que discordam da aplicação das novas regras.


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Exemplos se verificam no contencioso instaurado por exigências ilegais pelo fisco da abertura de beneficiário final ou tentativas irregulares de uso da convenção multilateral para acesso a informações protegidas, no Brasil ou no exterior. Com a lei geral de proteção de dados, é possível que alguns desses debates ganhem ainda mais atualidade.

 

Mesmo na jurisprudência do STF, desde o emblemático precedente de 2016 sobre sigilo bancário, decisões mais recentes passaram a sinalizar preocupação maior quanto aos limites exigidos para compartilhamento de informações privadas com a administração pública, tanto em casos gerais (ex. ADI 6387, de 2020), como também em tributários (ex. RE 5729, de 2021, sobre o sigilo de informações prestadas no RERCT).

 

*Hermano Barbosa é sócio da área tributária do BMA Advogados.

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