Os riscos da terceirização sem fiscalização

Da baixa qualidade à baixa produtividade, os reflexos negativos da terceirização são inúmeros./Canva
Da baixa qualidade à baixa produtividade, os reflexos negativos da terceirização são inúmeros./Canva
Consequências vão além do passivo trabalhistas, podem também impactar imagem e valor de mercado.
Fecha de publicación: 31/03/2023

Em março de 2017, foi publicada a Lei nº 13.429/2017, que permitiu às empresas brasileiras a terceirização de todas as suas atividades. Na época, isso foi visto com entusiasmo pelo setor empresarial do país, considerando que as vantagens em utilizar essa modalidade de contratação eram inúmeras, desde a possibilidade de a empresa focar seus ativos no core business até reduzir os custos com folha de pagamento e encargos trabalhistas.

Porém, já em 2018, por meio de artigos veiculados em inúmeras mídias digitais e físicas como advogada trabalhista, já alertava sobre os riscos ocultos da terceirização desmedida. Apesar das vantagens, a lei estabelece que a empresa que utiliza essa espécie de contratação pode ser responsabilizada pelos trabalhadores contratados por prestadoras de serviços, uma vez que traz a esta o dever de fiscalizar o correto pagamento e as condições de trabalho oferecidas.

Engana-se quem acredita que o impacto da ausência de fiscalização virá apenas no seu passivo trabalhista e sua responsabilização por verbas e direitos dos trabalhadores da prestadora contratada. As consequências podem, também, impactar sua imagem e seu valor de mercado. Exemplo disso foi a queda em 2,75% das ações da empresa de engenharia MRV no primeiro pregão de 2013 da Bolsa de Valores de São Paulo, e o pagamento de 5 milhões em multa pela rede varejista espanhola Zara, em maio de 2017, ambas em razão da identificação de trabalho escravo em sua cadeia produtiva.


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Apesar dos alertas sobre os riscos e a necessidade de maior atenção das empresas para com seus trabalhadores terceirizados, e até mesmo exemplos práticos sobre as consequências, no primeiro trimestre de 2023 tomamos conhecimento de novos fatos envolvendo trabalho análogo à escravidão. Entre eles, a repercussão sobre três das principais vinícolas da Serra Gaúcha e, mais recentemente, o festival Lollapalooza.

Passaram-se dez anos entre o primeiro e o último caso mencionados nos exemplos e a justificativa apresentada continua sendo a mesma: o desconhecimento das empresas acerca da existência de irregularidades em suas terceirizadas.

Tal situação comprova que, apesar da tentativa legislativa em regularizar e impor às empresas a responsabilidade pela fiscalização de prestadoras de serviços contratadas, o empresariado ainda peca pela ausência de uma política de compliance ou de acompanhamento de situações diárias que ocorrem em sua produção.


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E as desvantagens não se limitam às questões trabalhistas. Segundo pesquisa realizada no ano de 2014 pela Consultoria Deloitte, em 140 empresas de 30 países, quase metade das pesquisadas reclamaram da baixa qualidade do serviço prestado e da falta de inovação das terceirizadas.

Da baixa qualidade à baixa produtividade, decorrentes tanto da desigualdade salarial entre o trabalhador terceirizado e o empregado da empresa terceirizadora, quanto da ausência de motivação das pessoas que realizam suas atividades em prol de outras empresas que não suas empregadoras, os reflexos negativos da terceirização são inúmeros. Tanto é assim que grandes incorporações já estão internalizando funções que eram realizadas por prestadoras de serviços.

Desta forma, antes de tomar qualquer decisão acerca da terceirização, a empresa deve não apenas analisar estrategicamente as atividades a serem repassadas, mas também é importante solicitar às prestadoras documentos que comprovem a sua capacidade financeira, a sua reputação, além de seu histórico, acompanhando e fiscalizando periodicamente as condições de trabalho oferecidos pela prestadoras aos trabalhadores cedidos. Só assim os benefícios da terceirização poderão ser usufruídos pela corporação a curto, médio e longo prazos.

*Marceli Brandenburg Blumer, advogada trabalhista empresarial, sócia-fundadora da Smart Judice e EZDoc, legaltechs voltadas para a área jurídica e do Messias e Brandenburg Blumer Advogados Associados.

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