Aprovada na semana passada pelo Congresso Nacional, e regulamentada pelo Ministério da Saúde no mês de março, a telemedicina é apontada como uma solução para atendimentos médicos enquanto autoridades pedem que o máximo de pessoas fiquem em casa. O esforço em viabilizar uma prática estudada há anos pode representar um alívio nesse período de pandemia.
Para advogadas das áreas de direito do consumidor e cível, a medida permite trazer um conforto momentâneo ao atendimento médico, mas pode aumentar a discussão por erros médicos nos tribunais. "Uma vez que a telemedicina tende a avançar, casos de litigiosidade podem a aumentar", apontou a professora de direito do consumidor e Diretora do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), Simone Magalhães.
Todos os advogados ouvidos pela reportagem consideraram que o Código de Defesa do Consumidor, aprovado em 1990, ainda sim é capaz de tratar de questões como a telemedicina. "[O Código] É uma lei de aspecto geral, que aponta diretrizes a serem seguidas sobre a questão", apontou Keila Acipreste, advogada da área cível do Rayes & Fagundes Advogados Associados.
Para Simone, há a possibilidade da aplicação de outras leis mais recentes para a interpretação de atos que ocorram durante atendimentos médicos virtuais, como, por exemplo, o Código Civil e a Lei Geral de Proteção de Dados ( LGPD).
"Houve, no início da pandemia de Covid-19, uma busca muito grande por saber que famosos ou políticos estariam com a doença. Este é um exemplo de como é necessário, no caso da telemedicina, proteger os dados de pacientes e médicos", disse.
As advogadas apontam que seria um problema a obtenção de provas em ambiente virtual em caso de litigiosidade, uma vez que haverá a necessidade de que se produzam uma série de documentos e se siga uma série de procedimentos. "Sempre existirá o prontuário, que é uma prova bastante robusta", afirmou Acipreste, que reiterou o fato de que consultas não podem ser gravadas por nenhuma das partes, uma vez que existe o sigilo entre médico e paciente deve sempre ser preservado.
Os textos publicados pelo Ministério da Saúde e pelo Congresso têm pontos em comum: tanto o decreto legislativo quanto a portaria ministerial garantem o funcionamento da telemedicina como uma ação emergencial, válida apenas enquanto durar o período de calamidade provocado pelo novo coronavírus.
O texto aprovado pelo Legislativo ainda aguarda sanção da Presidência da República.
Enquanto o decreto legislativo torna válidas "receitas médicas apresentadas em suporte digital, desde que possuam assinatura eletrônica ou digitalizada do profissional que realizou a sua prescrição", a portaria, mais detalhada, aborda as práticas e dispositivos que médicos poderão utilizar durante a execução da consulta. O texto ministerial também fala sobre o prontuário, que poderá ser aceito em via digital.
O Conselho Federal de Medicina (CFM), que disciplina a atividade da medicina no país, também se mostrou favorável à ideia. Em ofício enviado ao ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, a entidade reconheceu a possibilidade e a questão ética da utilização da teleorientação (que é o encaminhamento e orientação de pacientes isolados), do telemonitoramento (ato realizado sob orientação e supervisão médica para monitoramento ou vigência à distância de parâmetros de saúde), e teleinterconsulta – quando há apenas trocas de informações.
Segundo o CFM, qualquer ato fora deste escopo não se enquadrará na resolução interna do órgão sobre o tema, o que pode acarretar em sanções a quem assim o fizer.
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