Falta da CNH gera multa, mas não indica culpado em caso de acidente

O documento em formato digital pode evitar que o motorista cometa a infração leve de esquecer a carteira/Agência Brasil
O documento em formato digital pode evitar que o motorista cometa a infração leve de esquecer a carteira/Agência Brasil
Caracterização depende de prova da relação de causalidade entre a falta de habilitação e o acidente.
Fecha de publicación: 03/06/2022

Em 2021, 632.764 acidentes de trânsito foram registrados no Brasil, de acordo com o Registro Nacional de Acidentes e Estatísticas de Trânsito (RENAST), da Secretaria Nacional de Infraestrutura. Foram 72 acidentes por hora, que ocasionaram 11.647 mortes. Ao todo, 32 vidas foram perdidas por dia. Os acidentes são ocasionais, por imprudência ou até provocadas com a real intenção de quem está dentro do carro. Porém, a falta da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) por parte dos envolvidos não assegura a culpa de quaisquer das partes.

Esse é o entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que por unanimidade reafirmou que a ausência do documento não leva ao reconhecimento de sua culpa -- cuja caracterização depende de prova da relação de causalidade entre a falta de habilitação e o acidente -, de acordo com o divulgado e publicado pelo portal de notícias do STJ. O colegiado manteve acórdão do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) que condenou uma transportadora a indenizar motorista vítima de colisão entre seu carro e um veículo da empresa.

"A sábia decisão do Superior Tribunal de Justiça levou em consideração as infrações presentes no sinistro: de um lado uma motorista com carteira de habilitação vencida e de outro um motorista que realizou uma ultrapassagem proibida e que colidiu com o veículo anterior que estava corretamente na faixa. Ou seja, mesmo que ambas sejam infrações de trânsito, é preciso observar o nexo causal - circunstância que liga a ação com o evento danoso para caracterizar a responsabilidade civil prevista pelo artigo 927 e seguintes do Código Civil em vigor", explicou a professora de Direito da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília (FPMB), Catharina Taquary Berino.


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Embora a CNH do motorista do carro estivesse vencida, o TJBA entendeu que a empresa não comprovou relação direta entre essa circunstância e o acidente. No caso analisado, a vítima viajava com a família quando seu carro foi atingido pelo caminhão da transportadora, que fazia uma ultrapassagem indevida na contramão. A vítima ingressou com ação de indenização contra a empresa no STJ.

"Mesmo que ambas sejam infrações de trânsito, é preciso observar o nexo causal - circunstância que liga a ação com o evento danoso para caracterizar a responsabilidade, visto que quem ocasionou o dano foi o motorista que realizou a ultrapassagem. O fato da CNH vencida não foi pressuposto para o sinistro, motivo pelo qual não há culpa concorrente", acrescentou a docente.

Nexo Casual

No recurso ao STJ, a transportadora alegou violação do artigo 945 do Código Civil. De acordo com a empresa, existiria culpa concorrente da vítima, porque ela estava com a CNH vencida e, ao dirigir, colocou a sua família em risco. Para a recorrente, não se trata de mera irregularidade formal por infração administrativa, pois o motorista do carro teria contribuído diretamente para o acidente.

A ministra Nancy Andrighi, relatora, explicou que, de acordo com a teoria da causalidade adequada, sendo comprovado que a conduta da vítima foi determinante para a ocorrência do dano, pode ser reconhecida a concorrência de culpas -- considerada, nessa hipótese, uma atenuante da causalidade.

Para a caracterização da concorrência de culpas, prosseguiu, é necessário comprovar a conduta culposa praticada pela vítima e o nexo de causalidade entre essa conduta e o evento danoso; se ambos forem confirmados no decorrer do processo, a indenização poderá ser reduzida, como previsto no artigo 945 do Código Civil.

Por outro lado, a ministra citou doutrina no sentido de que o simples comportamento antijurídico da vítima em determinado evento não é suficiente para configurar sua culpa concorrente. É preciso, segundo ela, averiguar se as atitudes da vítima, ao lado da conduta do autor do dano, concorreram como concausas para o evento danoso.

Nancy Andrighi destacou que, embora o fato de a vítima não ter CNH válida possa caracterizar ação imprudente e violação do artigo 162, inciso V, do Código de Trânsito Brasileiro, o TJBA foi expresso ao decidir que esse fato não concorreu para o acidente.


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Infração

No Brasil, sair e esquecer a carteira em casa, o que está cada vez mais difícil, devido à disponibilidade do documento em formato digital, resulta em uma infração de natureza leve, que custa R$ 88,38. Porém, quem dirige sem possuir uma CNH assume uma infração de natureza gravíssima, que custa R$ 880,41. E quem permite que pessoas desabilitadas dirijam seus veículos também assumem a mesma punição.

Portar a CNH é necessário quando se está ao volante, conforme o art. 159 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), parágrafo 1º.

"A sociedade desperta interesse especial quando se trata de infrações de trânsito pela tangibilidade prática do tema", concluiu a pesquisadora. Com informações do CTB e do Portal de Notícias do Superior Tribunal de Justiça.

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