Trade dress é um conjunto distintivo que se refere à aparência identificável de um produto ou serviço, incluindo elementos diversos, tais como embalagens, cores, formas, designs, entre outros, que permitem que os consumidores associem uma determinada empresa ou marca a essas características visuais específicas. Considerando a constante evolução do comércio e das relações empresariais, o tema vem ganhando cada vez mais relevância no ordenamento jurídico brasileiro.
Atualmente, num cenário em que a concorrência entre empresas é acirrada, este conjunto distintivo desempenha um papel importante na proteção da identidade e na diferenciação dos negócios. Isso porque, ao estabelecer uma imagem única e facilmente reconhecível, o trade dress é o principal contribuinte para a construção de uma reputação no mercado e, consequentemente, para a fidelização dos consumidores.
Embora o ordenamento jurídico brasileiro não possua previsão legal expressa que trate do trade dress, essa forma de proteção é reconhecida e amparada por meio da Lei da Propriedade Industrial (Lei Federal nº 9.279/1996), que estabelece as bases legais para a concessão de patentes, o registro de marcas, o combate à concorrência desleal e a proteção dos desenhos industriais, abrangendo, portanto, aspectos fundamentais para a proteção do conjunto-distintivo da empresa.
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A Lei da Propriedade Industrial oferece amparo legal por meio da proteção das marcas registradas, que podem incluir elementos visuais distintivos que compõem o trade dress de um produto ou serviço. Além disso, a legislação também abrange a proteção dos desenhos industriais, que englobam aspectos visuais de um produto, como forma, cor e ornamentação, contribuindo para a proteção dos elementos de caráter singular em determinados casos.
As manobras para confundir o consumidor podem ser realizadas por meio de cópia idêntica ou mesmo pela reprodução dos elementos centrais que compõem o trade dress. Com base na nossa legislação, é possível buscar a proteção legal desses elementos, desde que comprovada sua utilização efetiva no mercado.
Em relação às marcas registradas, é possível incluir elementos visuais distintivos no registro que sejam capazes de identificar e diferenciar os produtos ou serviços de uma empresa dos concorrentes. Com isso, características como cores, formatos de embalagens e logotipos recebem a devida proteção como partes integrantes da marca.
Um exemplo de caso concreto envolvendo a proteção do trade dress é o da marca Christian Louboutin. Em maio de 2018, o Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu o sapato com sola vermelha como marca da grife francesa. Tal decisão passou a impedir que a marca brasileira Bruna Silvério produzisse artigos usando a característica da sola, reconhecendo a singularidade do elemento visual como parte integrante da marca.
Além dessas modalidades de proteção, o trade dress também é amparado pelos princípios gerais do Direito da Concorrência, que visam evitar práticas desleais e enganosas no mercado. No caso de uma empresa utilizar elementos visuais semelhantes aos de um concorrente, alegando uma suposta confusão para os consumidores ou diluição da identidade da marca, será cabível o acionamento dos mecanismos de proteção contra concorrência desleal como: ação de violação de direitos autorais, ação de nulidade, medidas cautelares e representação junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) ou ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE).
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Apesar da previsão legal expressa do instituto do trade dress no Brasil, cabe esclarecer que cada caso é analisado individualmente pelos doutrinadores. Nossa Jurisprudência tem reconhecido a possibilidade de proteção do trade dress somente quando se mostra comprovado o caráter distintivo e não funcional do conjunto-distintivo.
Um exemplo de julgado recente envolveu as marcas MARITUCS ALIMENTOS LTDA. e AMENBRA ALIMENTOS LTDA., de fevereiro de 2023. Na análise do caso concreto, a 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo negou a existência de concorrência desleal por semelhanças nas embalagens dos dois produtos. Conforme o relator, desembargador Grava Brazil, “a distinção do elemento nominativo (nome dos produtos) não é o bastante para rechaçar o aproveitamento do conjunto-imagem alheio, visto que, nas comparações visuais de trade dress, deve-se levar em conta o todo e não apenas os elementos visuais de forma isolada, uma vez que o consumidor, ao se deparar com o produto, não examina suas características isoladamente, mas sim sua integralidade”, concluindo que não houve aproveitamento parasitário de identidade. A decisão foi por maioria de votos, em julgamento estendido.
Em resumo, embora o ordenamento jurídico brasileiro não possua uma previsão legal específica para o trade dress, a proteção se dá por meio de outros instrumentos legais como marcas registradas, desenhos industriais, princípios do Direito da Concorrência, reconhecimento pela doutrina e efetiva obtenção de remédios de proteção através do Judiciário. A proteção do trade dress contribui para o consumidor reconhecer, de forma imediata, o produto ou serviço através da identidade da marca, o que garante sua diferenciação no mercado e o respeito a sua preferência.
*Jéssica Rocha Domingues Chagas é advogada do escritório Ernesto Borges Advogados, atua em Empresarial.
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