Câmara vai atrás do AirBNB e similares para custear fundo de turismo

Proposta de taxar imóveis alugados por temporada e embarques internacionais devem custear Fungetur/Pixabay
Proposta de taxar imóveis alugados por temporada e embarques internacionais devem custear Fungetur/Pixabay
Projeto em discussão prevê imposto de 7% para qualquer locação de imóvel por temporada.
Fecha de publicación: 22/11/2021

O Fundo Geral do Turismo, conhecido como Fungetur, é um dos diversos mecanismos de crédito ao fomento de setores específicos da economia brasileira - no caso, o incentivo a empresas diretamente ligadas ao setor de turismo. A Câmara dos Deputados planeja votar, ainda nas suas próximas sessões, uma reformulação de como o fundo, gerido pelo Ministério do Turismo e operado há meio século, é composto. 

Entre as grandes novidades, está a proposta de uma nova taxação por meio de “Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre locação de imóveis por temporada mediante plataformas digitais”. Essa nova CIDE, assim como a incidente nos combustíveis e em produtos de tecnologia, é chamada de Cide-App e incidiria sobre modelos de negócios considerados disruptivos no Brasil, como é o caso do AirBNB e do Booking, que opera com proposta semelhante.

O texto, apresentado pelo deputado Otávio Leite (PSDB/RJ), prevê a taxação de sete por cento no valor do contrato de locação do imóvel, a ser recolhido pela plataforma. Esta seria uma das duas CIDEs a serem propostas como fonte de renda do novo fundo - a outra prevê uma cobrança de 18 dólares por cada embarque internacional feito no Brasil (hoje, isso encareceria a passagem em R$99,84).

No caso das plataformas digitais, a proposta não estava no texto original do PL (projeto de Lei). Como passou a ser costumeiro durante a pandemia, a proposta não circulou pelas comissões da Câmara dos Deputados, indo direto ao Plenário. Relator da proposta, Otávio não explica, em nenhum dos relatórios apresentados, o porquê de incluir o novo tributo. 


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Em um encontro na Associação Comercial do Rio de Janeiro, na semana passada, o deputado definiu a questão como “delicada” e “uma confusão danada”: “As pessoas não querem mais pagar nada, e elas têm suas razões inclusive”, falou aos associados. “A gente sabe que são uma realidade, e ninguém aqui é contra AirBNB - mas todos somos a favor de justiça tributária.”

“Qualquer sítio turístico do mundo tem um AirBNB”, continuou o parlamentar, “mas em qualquer sítio do mundo tem uma disciplina”. O deputado lembrou o caso de Barcelona, que proibiu que anfitriões aluguem quartos privados dentro de seus imóveis, para evitar o turismo de massa. “Quem paga depois, o que fica? E a quantidade de lixo gerado, e o consumo dos equipamentos públicos? Há que se pensar nisso.” 

Otávio diz que, no entanto, o objetivo principal do novo Fungetur não é tributar novas tecnologias, e sim garantir que o dinheiro d o Fundo permaneça disponível. 

“É indispensável fazer com que esses R$3,5 bilhões prossigam no Fungetur. Não permitir que o turismo brasileiro perca R$3,5 bilhões”, defendeu. “Há uma  mecânica contábil-financeira-administrativa-fiscal que a União executa anualmente em dezembro: o que não foi gasto em dezembro, se puxa pro Tesouro Nacional e ninguém vê esse dinheiro”. O novo texto também propõe que o dinheiro do Fungetur vá não apenas para infraestrutura em cidades turísticas, mas também em promoção turística no Brasil e no exterior. 


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Alexandre Matias, que é sócio de direito imobiliário da Advocacia Maciel, aponta que a proposta precisa ser melhor debatido com a sociedade. “É razoável que se tenha um equilíbrio fiscal entre os atores que atuam no mesmo segmento. A ausência de um enquadramento fiscal fomenta a evasão fiscal por parte dos proprietários de imóveis utilizados para a locação por aplicativo”, defendeu o advogado. “Contudo, deve ser sopesado que o setor do Turismo foi o mais impactado pela crise oriunda do Coronavirus, razão pela qual a tributação não pode virar um entrave, ainda que momentâneo, para retomada do setor.”

Em um curto email, o AirBNB informou à LexLatin que não comenta projetos de Lei em tramitação. A Booking, uma das principais empresas neste setor, também foi procurada - mas não respondeu até o fechamento desta reportagem. A Abih (Associação Brasileira da Indústria de Hotéis) também foi procurada, mas não retornou os contatos até à publicação da matéria.

Alexandre Matias lembra que o setor de turismo no Brasil é mal explorado - o país recebeu 6,3 milhões de turistas em 2019, contra 89 milhões da França naquele ano. A Cide, portanto, pode ser bem-vinda para atender investimentos em setores básicos como segurança, infraestrutura, e mobilidade urbana. “A CIDE do Turismo deve observar investimentos que tenham relação com esse segmento específico, não sendo possível destinar esses recursos para outras áreas”, disse.

O advogado argumenta, no entanto, que essa ação não poderia cercear artificialmente a inovação deste setor. “O poder Legislativo deve assumir sua função constitucional de legislar e regulamentar a situação dessa modalidade de locação por aplicativo para evitar que o Poder Judiciário seja o responsável de forma indireta por definir as regras dessa atividade econômica”, argumentou. “A definição sobre as regras da locação de imóveis por aplicativo não pode ficar a cargo do Judiciário”, cabendo ao Legislativo promover esse debate.

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