Para onde está indo o mercado de transporte por aplicativo no Brasil?

Novas propostas, muitas regionais, prometem taxas menores e mais benefícios para clientes e motoristas/ Alexander Torrenegra/Wikimedia Commons
Novas propostas, muitas regionais, prometem taxas menores e mais benefícios para clientes e motoristas/ Alexander Torrenegra/Wikimedia Commons
Evolução das leis permite entrada de novas empresas e maior concorrência para enfrentar Uber e 99.
Fecha de publicación: 08/02/2022

Uma inflação fora de controle; o preço do combustível em disparada inédita; aumento no preço dos veículos novos, seminovos e da manutenção destes carros: tudo conspirou para que, em 2021, os aplicativos de transporte privado começassem a sentir na pele uma queda na qualidade do serviço. Se você é usuário tanto da Uber quanto da 99 (que, após a saída da Cabify do Brasil, possuem quase um duopólio na atividade), já deve ter se acostumado a reclamações a respeito da falta de motoristas interessados em trabalhar sob tais condições, assim como clientes incomodados com o aumento de preços nas viagens.

Essa situação de aparente “perde-perde” abre brechas para que novos concorrentes disputem o mercado - e mesmo para que velhos atores, como os táxis, possam se reinventar para voltar à arena. Em aeroportos como o de Brasília, os táxis voltaram a dar as caras, com a promessa de valores de viagens menores que os concorrentes de aplicativo.


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Uma concorrente em específico propõe a criação de aplicativos próprios para cidades onde Uber e 99 não possuem tanta penetração. A proposta, que tem de ser contratada pelo município, tem uma capacidade maior de atrair motoristas, já que a taxa de manutenção do aplicativo não é maior que 5% do valor da viagem - na Uber, pode chegar a 48%.

Em Araraquara, cidade de 240 mil habitantes no interior de São Paulo, o projeto começou no início de janeiro - após quase dois anos de discussões em âmbito municipal sobre como contornar o transporte pelos principais aplicativos. O projeto, que é comandado pela Cooperativa de Transportes local, já é considerado um caso de sucesso, com cerca de 200 veículos cadastrados e sete mil clientes.

A diferença, em um primeiro momento, está no fato de que a cooperativa não tem fins lucrativos, permitindo que o valor descontado seja apenas para a manutenção do aplicativo. A alíquota máxima, de sete por cento de desconto, não apenas reduz o preço da tarifa como aumenta a lucratividade do motorista. 

Especialistas ouvidos pela LexLatin indicam que o cenário brasileiro é competitivo para novos players deste mercado e que, desde a entrada da Uber no mercado brasileiro, em 2014, o arcabouço legal sobre o tema evoluiu. 

Há uma Lei federal, sancionada por Michel Temer, que já trata do tema - e que garante competência exclusiva aos municípios para regulamentar a questão. Desde então, das desconfianças do poder público e do lobby do táxi, que tentou impedir a legalização do transporte por aplicativo, hoje sobraria muito pouco no país. 

“Regulação não é barreira de entrada no Brasil”, explica Eric Hadmann, sócio do Hadmann, Herrera & Dutra Advogados. ”O que não significa que não haja municípios que dificultem um pouco a vida de novos entrantes, que criem burocracias e tornam a vida mais difícil destes aplicativos. Mas isso está muito mais tranquilo hoje em dia. O Brasil tem espaço de competição e regulação já não é mais barreira desde 2018 e 2019.”

Erico Carvalho, sócio da Advocacia Velloso, lembra que em um primeiro momento alguns municípios tentaram inviabilizar a atividade, mas em 2018 o STF (Supremo Tribunal Federal) colocou um freio na questão. “Quando do julgamento do RE 1054110 e da ADPF 449, o STF declarou a inconstitucionalidade de toda e qualquer restrição desproporcional ao transporte intermediado por aplicativos”, explica.

Desde então, segundo o advogado, ficou evidente que aos municípios e ao Distrito Federal caberia apenas instituir regras complementares à Política Nacional de Mobilidade Urbana, “sem, contudo, inovar em relação às normas primárias, contrariando ou ampliando os requisitos para o exercício da atividade de transporte individual privado.”


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Eric indica que o Estado e seu poder regulador não é mais o aspecto definidor para a entrada ou não de concorrentes no mercado. Isso dependeria mais, em sua visão, de tecnologia e estrutura de incentivos para o seu uso. “O grande desafio de qualquer plataforma de dois lados é equalizar a estrutura de incentivo entre motorista e passageiro”, pondera.  O acesso a carros novos também pressiona a qualidade dos serviços, “e o segundo grande desafio é o acesso a carro. O terceiro não deixa de ser o preço de gasolina”, conclui.

Erico indica que o problema estaria nos legisladores municipais. “É necessário cuidado para evitar excessos de regulamentação e a imposição de exigências que, direta ou indiretamente, interfiram na essencialidade do serviço, no seu preço ou na sua oferta”, complementa. 

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