O que fazer quando surgem investigações de corrupção no escritório?

“A melhor maneira de mitigar uma situação de crise é fazê-lo antes que aconteça”, diz Nicky McHugh, da Communications Leadership. / Crédito da imagem: Unsplash, Saúl Bucio.
“A melhor maneira de mitigar uma situação de crise é fazê-lo antes que aconteça”, diz Nicky McHugh, da Communications Leadership. / Crédito da imagem: Unsplash, Saúl Bucio.
Quais as medidas que devem ser tomadas em caso de denúncia de um sócio do escritório?
Fecha de publicación: 30/10/2023

No final de agosto, o caso de Romero Cabral da Costa Neto, ex-advogado visitante da Gibson Dunn & Crutcher LLP, vindo do Mattos Filho, ganhou destaque na imprensa especializada. Da Costa Neto, de nacionalidade brasileira, foi acusado de 'negociação de informação privilegiada' em relação a uma operação avaliada em 1,7 bilhão de dólares para um cliente da firma do ramo da indústria farmacêutica.

 

Trata-se do acordo em que Gibson Dunn assessorou a CTI BioPharma e a cujos documentos Costa Neto teve acesso indevido. O advogado comprou então mais de 10 mil ações da CTI no dia 9 de maio, um dia antes do anúncio da transação, e vendeu os títulos no dia seguinte, gerando um lucro de 42 mil dólares, segundo a ação judicial apresentada pelos EUA. Comissão de Segurança e Câmbio. Da Costa Neto foi preso naquela mesma semana. Os escritórios de advocacia envolvidos esclareceram que da Costa Neto não fazia mais parte dessas organizações.

 

Nenhum escritório está isento de enfrentar situação semelhante, envolvendo qualquer um de seus integrantes (sócios, sócias, associados, associadas e profissionais de outras áreas). Neste artigo exploramos o tema da gestão da crise reputacional com a ajuda de Nicky McHugh, estrategista sênior de comunicação da Communications Leadership, com sede em Nova York, e de Stephen Revell, da Lexington Consultants, especialista em gestão de escritórios de advocacia e desenvolvimento de negócios, e ex-sócio da Freshfields, Londres.


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A bomba explodiu: o que fazemos internamente?

 

Internamente, “a melhor forma de mitigar uma situação de crise é fazê-lo antes que ela aconteça”, diz McHugh, que recomenda que a empresa tenha um protocolo para lidar com a situação. “Em resposta a uma investigação de corrupção envolvendo um sócio, as ações imediatas devem se concentrar na preservação da integridade operacional do escritório”, esclarece. “Primeiro, isole a pessoa sob investigação do trabalho ativo com clientes e dos casos em andamento para evitar potenciais conflitos de interesse”, acrescenta. “A seguir, comunique-se com os diretores do escritório com transparência e confidencialidade. Esteja ciente de que as comunicações internas têm o potencial de vazar e tornar-se públicas. Tenha isso em mente ao planejar suas mensagens”, diz McHugh.

 

Para Revell, “é importante desde o início manter a mente aberta quanto à ‘culpa’ do sócio ou sócia em questão. Numa fase inicial, pode ser simplesmente uma acusação e o sócio ou sócia deve ser considerado inocente até prova em contrário. No entanto, ainda é preciso tomar medidas”.


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Conversas difíceis

 

Revell sugere realizar imediatamente uma reunião com o envolvido para apurar duas questões: “deve-se perguntar ao sócio ou sócia com muita clareza se as acusações são verdadeiras ou falsas e se há algo ‘cinza’, ou seja, se ele ou ela fez algo ruim. As perguntas devem ser formuladas com clareza. “Esta conversa será inevitavelmente um ‘interrogatório’ desagradável”, diz ele.

 

Em relação ao segundo ponto, “deve ser solicitado ao sócio que detalhe todos os assuntos em que está trabalhando e tudo o que está fazendo em nome da empresa, por exemplo, participar de conferências”, acrescenta.

 

“Se ele ou ela admitir ter cometido um crime grave, medidas imediatas devem ser tomadas, essa pessoa deve renunciar e/ou ser destituída”, afirma Revell. “Será necessário remanejar todas as atividades internas e externas do sócio ou sócia. Deverá parar de trabalhar com clientes imediatamente e outros parceiros terão que assumir o controle dos assuntos. A pessoa que sai deve ser obrigada a cooperar com essa transferência. Qualquer atividade que envolva representação do escritório deverá ser assumida também por outros sócios. Se o sócio ou sócia tiver poderes de assinatura sobre contas bancárias, diretorias ou qualquer outra autoridade dentro da empresa, esses deverão ser cancelados imediatamente”, afirma Revell.

Agora, se o sócio ou sócia nega as acusações e qualquer irregularidade, “a empresa deve decidir o que fazer. Dependendo da gravidade das acusações e, na verdade, da sua “confiança” na pessoa acusada (se você ainda acredita nela), as possíveis ações incluem:

  • Terminar a relação profissional com o sócio ou sócia, podendo incluir referência à sua reintegração em caso de absolvição.
  • Suspensão até sua absolvição.
  • Declaração de apoio ao sócio ou sócia durante a investigação e, enquanto isso, que ele ou ela continue com suas atividades habituais”, finaliza Revell.

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Comunicação externa

 

Quando se trata de comunicação com os clientes, McHugh sugere “abordar o problema com franqueza” e “que as preocupações dos clientes sejam ouvidas e sejam fornecidos pontos de contato alternativos”. Ele acrescenta que se deve “evitar detalhes especulativos e focar na manutenção da confiança por meio de comunicação constante e visibilidade da liderança”.

 

Em relação aos meios de comunicação social, McHugh recomenda que “seja imediatamente emitida uma breve declaração reconhecendo o conhecimento da situação e o início de uma investigação interna”. “É importante que todas as comunicações sejam breves e concisas. Outro ponto fundamental é que todas as mensagens sejam consistentes entre diferentes públicos: o que você diz aos seus funcionários, aos seus clientes e à mídia deve ser consistente.”

 

Nesse sentido, recomenda “programar a comunicação externa para coincidir com a comunicação interna mais ampla, para garantir que a primeira vez que os funcionários tomem conhecimento disso não seja de conhecimento público”. Por fim, é essencial – segundo McHugh – “expressar o compromisso de cooperação com as autoridades e reiterar a adesão da empresa aos padrões éticos”, além de “limitar os detalhes para evitar rumores especulativos”.


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A importância do acordo de sócios

 

Embora seja verdade que nem todas as “eventualidades” possíveis de uma relação profissional podem ser previstas em acordos de acionistas, tanto McHugh como Revell concordam que são instrumentos muito importantes para delimitar responsabilidades e definir o curso de ação em situações delicadas.

 

Na visão de McHugh, elas ajudam a “delinear expectativas em relação à conduta ética e conformidade legal dentro da empresa”, enquanto “as cláusulas de penalidade podem incluir sanções financeiras, mecanismos de expulsão ou confisco de ações em caso de má conduta comprovada”. Ele acrescenta que devem ser considerados contratos com clientes, bem como acordos de adiantamento. “Se o acordo do cliente prevê a possibilidade de remover um advogado ou advogada suspeito de corrupção do seu caso, será necessário garantir que os acordos de acionistas e os contratos individuais de trabalho incluam linguagem que apoie essa ação”, diz McHugh.

 

Na mesma linha, Revell destaca que “um acordo de acionistas não pode evitar que esses problemas surjam, mas pode estabelecer regras claras para quando isso acontecer, por exemplo, o sócio ou sócia pode ser afastado ou suspenso nessas situações?” Ele acrescenta que o acordo dos sócios também deve abordar temas financeiros importantes: “O sócio ou sócia ainda é pago durante o período de suspensão? O sócio é “pago” se for afastado nestas circunstâncias, especialmente se for comprovada a sua inocência? Há muito a considerar e as respostas serão exclusivas para cada escritório de advocacia. “O importante é que o acordo de acionistas/acordo de parceria aborde essas questões.”

 

Para Mari Cruz Taboada, sócia da Lexington Consultants, “é preciso rever o acordo de acionistas ‘hoje’ para garantir que os sócios possam ser demitidos em muito pouco tempo nas circunstâncias analisadas neste artigo”. Da mesma forma, Taboada indica que será necessário “refletir sobre as consequências financeiras de uma aposentadoria ou demissão no contexto de práticas impróprias ou atos de corrupção”.

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